Luís Amado – 2014-07-28

Comissão Parlamentar de Inquérito aos Programas relativos à Aquisição de Equipamentos Militares (EH-101, P-3 Orion, C-295, torpedos, F16, submarinos, Pandur II)

22.ª Reunião (28 de Julho de 2014)

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SUMÁRIO

O Presidente (Telmo Correia) deu início à reunião às 15 horas e 6 minutos.

Procedeu-se à audição do Dr. Luís Amado (Ministro da Defesa Nacional de março de 2005 a julho de 2006), que, após uma intervenção inicial, respondeu às questões colocadas pelos Deputados João Semedo (BE), Francisca Almeida (PSD), José Magalhães (PS), Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP), António Filipe (PCP) e Paulo Simões Ribeiro (PSD).

O Presidente encerrou a reunião eram 17 horas e 36 minutos.

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O Sr. Presidente (Telmo Correia): – Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 15 horas e 6 minutos.

Antes de mais, queria agradecer ao Dr. Luís Amado a forma pronta como nos atendeu, designadamente a mim, na qualidade de Presidente da Comissão, e como se dispôs, apesar da agenda apertada, que sabemos que tem, pelas funções que hoje desempenha, a estar nesta Comissão logo que possível. Por isso, queria agradecer a sua disponibilidade e dizer que, obviamente, o recebemos com gosto nesta Casa, que foi, é e será sempre também, a sua, durante tanto tempo.

Perguntava ao Dr. Luís Amado se pretende ou não iniciar esta audição com uma intervenção inicial, o que poderá fazer, até porque é uma faculdade sua; se não, passaremos às rondas de perguntas dos Srs. Deputados.

O Sr. Dr. Luís Amado (Ministro da Defesa Nacional de março de 2005 a Julho de 2006): – Muito obrigado, Sr. Presidente.

Farei apenas uma curta intervenção para testemunhar a disponibilidade manifestada para estar com os Deputados desta Comissão e pedir desculpa pelo facto de ter quebrado a ordem de convocatória dos ex-Ministros, mas tinha, de facto, compromissos fora do País.

É com grande satisfação que volto a esta Casa. Aliás, é a primeira que aqui estou desde que saí do Governo e, portanto, estou à vossa inteira disposição para esclarecer a Comissão.

Muito obrigado.

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O Sr. Presidente: – Muito obrigado, Sr. Dr. Luís Amado.

A lógica destas audições é por rondas de perguntas, sendo que na primeira ronda cada partido dispõe de 10 minutos, os quais são livres, ou seja, o partido tem 10 minutos e pode perguntar e voltar a perguntar, num sistema de questionário normal.

Temos também o sistema rotativo para que não seja sempre o mesmo partido a começaras rondas. Assim, nesta tarde, cabe ao Bloco de Esquerda abrir as perguntas e, portanto, dou a palavra ao Sr. Deputado João Semedo, que dispõe de 10 minutos.

O Sr. Dr. Luís Amado responde e, depois o Sr. Deputado, se quiser, pode retomar as perguntas.

Faz favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Semedo (BE): – Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, Sr. Dr. Luís Amado, a quem já cumprimentei mas que cumprimento novamente.

Deixarei para o fim duas perguntas crónicas que esta Comissão e eu próprio fazemos a todos os Ministros da Defesa, começando por uma pergunta genérica que lhe permita enquadrar o seu pensamento sobre esta questão dos programas militares e das respetivas contrapartidas. E a questão genérica é a seguinte: o Sr. Doutor, na altura, enquanto Ministro da Defesa sucedeu ao então Ministro Dr. Paulo Portas, que creio foi o Ministro da Defesa imediatamente antes. Gostava de lhe perguntar que avaliação fez, quando chegou ao Ministério, sobre o estado dos programas de aquisição de equipamento militar e das respetivas contrapartidas, isto é, qual foi o balanço que fez, porque, julgo, seguramente, foi das suas primeiras preocupações, não direi a primeira mas foi das primeiras.

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Pergunto-lhe isto — julgo que lhe perguntaria sempre, de qualquer forma — por duas razões diferentes: a primeira é porque, relativamente depressa, se não estou em erro, em 2006, julgo que o Sr. Doutor alterou a orgânica do funcionamento da Comissão Permanente de Contrapartidas, procedendo a alterações significativas até no enquadramento legal das funções e competências da Comissão. Portanto, pergunto-lhe se uma coisa tem a ver com a outra, se isso decorreu da avaliação que fez e qual foi essa avaliação.

Mas pergunto-lhe também por uma segunda e última razão, que é a seguinte: ainda em 2005, o Dr. Luís Amado considerou que as contrapartidas eram um embuste. Queria perguntar-lhe — e esta é a segunda razão por que lhe pergunto qual era a sua avaliação — se esta afirmação é uma afirmação genérica ou se é uma avaliação que decorre, exatamente, da avaliação que fez sobre o estado em que encontrou os programas militares e as respetivas contrapartidas.

O Sr. Presidente: – Para responder, tem a palavra o Sr. Dr. Luís Amado.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Sr. Deputado João Semedo, respondo-lhe, muito direta e objetivamente: quando assumimos funções, naturalmente que fazemos sempre uma avaliação de caráter político, com a vantagem de ter estado na oposição e no Parlamento e, portanto, ter tido a função de acompanhamento da atividade do anterior Governo e poder ter exercido essa função fiscalizadora que cabe aos Deputados, enquanto deputados da oposição, e, portanto, estava, naturalmente, em condições de fazer uma avaliação de caráter político sobre a política que vinha sendo seguida no setor.

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Como sabe, a política de defesa tem sido, felizmente, nesta Casa e ao longo de muitos anos, objeto de um forte compromisso interpartidário, no sentido de garantir alguma estabilidade num setor que todos reconhecem ser absolutamente vital para imagem e para a confiança e segurança do País.

Portanto, não entrei no Ministério desconhecendo a política que vinha sendo assumida porque, em grande parte, ela também era construída na base de um consenso, que se vinha protelando de governo em governo, ao longo dos últimos 20, 25 anos. Independentemente da mudança de governo, houve sempre, relativamente à política de defesa, o sentido de um compromisso mais alargado, envolvendo em muitas áreas – lembro-me disso sempre –, também o contributo das forças à esquerda do Partido Socialista. O Deputado António Filipe teve sempre um papel muito ativo na construção de soluções para os problemas de política de defesa, em nome do Partido Comunista, e, portanto, não era para mim estranho o que ia encontrar no Ministério da Defesa.

Assim, fiz um juízo de avaliação, muito rápido, aliás, sobre a situação porque, primeiro, não pus em causa os programas de aquisição que tinham sido decididos pelo anterior Governo, precisamente porque, em grande medida, eles visavam responder a um problema, que as Forças Armadas sentiam, de dificuldades de equipamento militar de grande importância para a manutenção da capacidade operacional das Forças Aramadas. Portanto, a situação de emergência em que alguns programas foram ativados ainda pelo anterior Governo, no sentido de reequipar as Forças Armadas com alguns sistemas de armas e de equipamentos muitos importantes para o futuro da instituição militar, tinham, naturalmente, a aceitação do Partido Socialista.

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Nesse sentido, a política que segui, de imediato, foi a de não interromper nenhum dos procedimentos que estavam em curso, pelo contrário, dar continuidade a alguns deles, excetuando a aquisição das fragatas Perry e a sua substituição, precisamente pela perceção que tive em determinado momento, também em concertação com a Marinha de Guerra, das dificuldades relacionadas com esse programa. Excetuando a ação que tive nesse domínio, todos os procedimentos que estavam em curso foram mantidos, numa linha de continuidade que entendi ser importante para preservar o interesse das Forças Armadas e o interesse do País.

Fiz um juízo diferente sobre o programa das contrapartidas e manifestei-o, de imediato, e agi também de imediato nesse sentido.

Lembro-me que não foi no início de 2006, foi logo, e creio que, dois meses depois, substituí o diretor da Comissão de Contrapartidas e convidei o Eng.º Rui Neves, que, creio, vai também ser ouvido pela Comissão — se não foi já ouvido, será ouvido dentro de algum tempo —, na exata medida em que era absolutamente indispensável, do meu ponto de vista, agir no sentido de conferir ao programa de contrapartidas um índice de execução e sobretudo de coerência, do ponto de vista dos seus objetivos, compatível com o que era a perceção, que já tínhamos, na oposição, desse problema.

Por isso, também encomendámos, de imediato, um estudo, na altura, creio que a uma organização do ISEG.

Peço desculpa, mas não tive tempo de ir ao detalhe de algumas destas decisões, mas creio que o Eng.º Rui Neves poderá precisar melhor alguns aspetos do que vos transmito. De todo o modo, encomendámos um estudo justamente para avaliar a eficácia dos programas de contrapartidas face à situação mais desorganizada que encontrámos na definição dos programas de contrapartidas.

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Creio que também por imperativo de tempo, na negociação dos programas de aquisição, as questões relativas aos programas de contrapartidas foram negociadas de forma menos exigente, havendo, nesse aspeto, responsabilidade da nossa parte. No entendimento que eu fazia de introduzir as correções necessárias, na sequência desse estudo, de um relatório que, aliás, enviei à Assembleia e apresentei na Comissão de Defesa ao tempo, propusemos uma alteração à comissão de contrapartidas, corrigindo alguns aspetos técnicos do funcionamento da Comissão, que nos pareciam absolutamente indispensáveis, introduzindo mecanismo de avaliação dos programas que permitisse ao decisor político estar mais seguro da eficácia do sistema no conjunto dos programas em negociação.

A figura que usei de «embuste» — e lembro-me, perfeitamente, de ter usado essa expressão, aliás, tive, depois, até a oportunidade de a discutir com o Dr. Paulo Portas, que estava já, como Deputado da oposição, no Parlamento — situava-a nesse aspeto de incoerência relativamente aos objetivos do que era uma doutrina de contrapartidas nos contratos de aquisição de equipamento militar que não estava devidamente salvaguardada na forma como os programas de contrapartidas tinham sido negociados e, sobretudo, como estavam a ser executados e implementados.

Essa era a minha preocupação. A preocupação era, justamente, de não iludir o impacto necessário que as contrapartidas deviam ter na inovação e na renovação do tecido industrial, em setores que podiam beneficiar de volumosos contratos de aquisição de equipamento. Era essa a doutrina que vigorava.

É certo que havia duas correntes: havia quem defendesse que as contrapartidas se deviam situar estritamente no campo das indústrias de defesa e havia outra corrente que defendia que as contrapartidas podiam ter

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impacto em outros setores económicos que viviam em comunicação, do ponto de vista comercial, com o setor das indústrias de defesa.

Fui favorável a uma interpretação, face à natureza dos contratos de contrapartidas que encontrei, de dar profundidade a uma doutrina que permitiria ao País beneficiar, com mais coerência e com mais eficiência, das contrapartidas de aquisição de equipamento militar em setores da indústria que deveriam merecer a atenção da economia do País.

Por isso mesmo, do ponto de vista estrutural, a minha preocupação foi – na altura, houve algum debate no seio do Governo sobre isso -, justamente, retirar a tutela exclusiva do setor das indústrias de defesa e da Comissão de Contrapartidas do Ministério da Defesa e conferir ao Ministério da Economia uma responsabilidade do acompanhamento dos programas de contrapartidas em renegociação ou em fase ainda de preparação, precisamente porque um dos aspetos estruturais mais negativos do sistema que estava em vigor, na minha perspetiva, era justamente o isolamento da negociação das contrapartidas de uma visão estratégica do desenvolvimento industrial e económico do País, que pudesse dele beneficiar.

Portanto, foram esses aspetos corretores que procurei introduzir na reforma a que fez referência na sua intervenção.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Semedo (BE): – Sr. Doutor, repare no seguinte: o Sr. Dr. Luís Amado foi Ministro da Defesa entre 2005 e 2006, se não estou em erro; entretanto, passaram oito anos e, enfim, se há consideração quase unânime nesta Comissão, quer entre os que constituem a Comissão, quer entre aqueles que aqui têm sido ouvidos, é que este processo das

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contrapartidas se tem traduzido em taxas de execução baixíssimas, claramente muito aquém daquilo que se previa e que seria desejável.

A pergunta que lhe quero fazer é a seguinte: apesar de ter substituído o presidente da comissão de contrapartidas, apesar de ter mudado a orgânica de funcionamento e o enquadramento legal da comissão das contrapartidas, apesar de ter passado a haver um maior envolvimento do Ministério da Economia, apesar dessas mudanças que foram introduzidas nessa altura, na realidade, essas mudanças não foram suficientes para que as contrapartidas adquirissem outra dinâmica e outra taxa de execução. A minha pergunta é: como é que se explica, na sua opinião, este insucesso relativo aos programas das contrapartidas, porque, aparentemente, por mais medidas que se tenham tomado no sentido de as tornar mais efetivas, na realidade, esse resultado não veio a obter-se.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Dr. Luís Amaro.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Sr. Deputado, essa é uma ilação que os Deputados desta Comissão devem extrair e não eu. Acho que o objeto desta Comissão é também fazer a avaliação de tudo o que foi feito nesse domínio relativamente ao sistema de contrapartidas e ao seu impacto positivo ou negativo do ponto de vista do interesse da economia e do País.

Eu limito-me, objetivamente, ao período em que exerci funções de Ministro da Defesa e ao período em que tomei algumas medidas, que me pareceram importantes, naquele momento, para corrigir alguns dos problemas estruturais que entendia que o sistema comportava.

Agora, a avaliação do que se passou, não estarei em condições de o fazer, a Comissão estará em muito melhor situação para o fazer, uma vez que vai ouvindo todos os diferentes ministros que tiveram

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responsabilidades, os diferentes representantes que, a nível oficial, assumiram responsabilidades no setor. Portanto, eu posso ter a minha opinião mas não vale para a Comissão de Inquérito emitir essa opinião.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Semedo (BE): – O Sr. Doutor disse, na sua intervenção inicial, que tinha tido uma opinião diferente relativamente aos programas e relativamente às contrapartidas, ou seja, que deu seguimento e andamento aos contratos de aquisição e, relativamente às contrapartidas, tomou outras iniciativas e outras diligências que já, entretanto, nos referiu.

A minha pergunta é a seguinte: na altura, quando tomou posse, reexaminou todas as condições contratuais dos contratos estabelecidos pelo anterior Ministro da Defesa, no caso concreto, o Dr. Paulo Portas? Ou seja, a avaliação que fez sobre as contrapartidas é muito diferente da que fez sobre os contratos em si, mas há algumas cláusulas dos contratos que, segundo diversas opiniões, são suscetíveis de crítica ou, mesmo que não seja de crítica, de terem sido elaborados de outra forma. A minha pergunta é se, na altura, quando tomou posse como Ministro da Defesa, fez um exame igualmente atento aos contratos como aquele que fez também às contrapartidas.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Doutor.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Não fiz nem tinha que fazer, na leitura que faço das funções e das responsabilidades de um ministro que entra em funções.

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Em relação aos contratos de contrapartidas, tinha essa responsabilidade e, aliás, uma das decisões que tomámos – o Eng.º Rui Neves poderá detalhar o que foi feito nesse domínio – foi de renegociar muitos desses contratos.

Em relação aos contratos de aquisição, como disse, excetuando o contrato de aquisição das fragatas Perry, que, então, estavam destinadas a substituir as fragatas da Marinha que tinham ultrapassado o seu tempo de operacionalidade, não tive essa preocupação — contratos são contratos, são contratos do Estado.

Sabe que parto sempre do princípio de que as pessoas, quando estão em funções, exercem essas funções com a preocupação de servir os interesses do País; não tenho uma atitude negativa em relação à generalidade da classe política e aos membros do Governo e, portanto, a responsabilidade de um membro do Governo, do meu ponto de vista, é olhar para o futuro e não olhar para o passado. O passado, se tem uma forma de contrato que vincula o Estado português, essa responsabilidade coube a quem desempenhou essas funções e, portanto, não pus em causa, de forma alguma, os contratos que tinham sido celebrados, nem o devia fazer.

Relativamente aos contratos de contrapartidas, que tinham de ser implementadas na sequência justamente das suas entradas em vigor, uma das orientações que foi seguida pela comissão de contrapartidas foi de renegociar esses contratos. Até porque a questão do «embuste» é um pouco esta: é que, de facto, grande parte desses programas tinha iniciativas e tinham projetos que não se compatibilizavam com a coerência necessária que um programa de contrapartidas, orientado pela doutrina que há pouco expus, devia ter.

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E também tenho um princípio de boa-fé. Acredito que um governo que negoceia os contratos de aquisição numa fase terminal de mandato está mais preocupado em negociar os contratos de aquisição, precisamente para deixar, digamos, o trabalho acabado, e deixar em aberto a possibilidade de os contratos de contrapartida poderem ser atualizados à medida que eles próprios vão sendo implementados.

Portanto, foi muito mais atabalhoada — digamos assim, passe a expressão — a negociação dos contratos de contrapartidas, face até a alguma inexperiência e ao volume de contratualização que foi assumido na fase final do anterior Governo, do a que os contratos de aquisição. Assim, não me mereceu qualquer reserva, a não ser, com o disse, a aquisição das fragatas Perry, por várias razões que, na altura, ponderei e me levaram a tomar a decisão de substituir esse sistema de armas pelo sistema de armas que hoje está em vigor.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Semedo (BE): – Sr. Doutor, o Dr. Paulo Portas, quando esteve aqui, referiu-se, no que diz respeito às contrapartidas do programa de aquisição dos submarinos, à expectativa que tinha, na altura, quando assinou as contrapartidas, do benefício que dessas contrapartidas poderia resultar para o futuro dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo.

Como sabemos, passados todos estes anos, na realidade, esse benefício acabou por se saldar não num prejuízo mas em nada. Gostava de lhe perguntar se, na altura, na revisão que fez das contrapartidas, o problema dos Estaleiros de Viana do Castelo e o eventual benefício que, para eles, poderia decorrer das contrapartidas assinadas ao tempo do Dr. Paulo Portas, ou seja, se, no seu mandato, houve alguma alteração nesse

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sentido desses contratos ou, pelo contrário, houve até, digamos, a reafirmação e a consolidação desses mesmos contratos relativos, como disse, ao futuro dos Estaleiros de Viana do Castelo.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Dr. Luís Amado.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Não tenho a ideia precisa do que foi feito nesse domínio, mas, mais uma vez, remeto para o Eng.º Rui Neves, que era quem chefiava a comissão de contrapartidas.

O princípio geral foi o de uma avaliação rigorosa dos programas e uma renegociação do que fosse possível renegociar desses programas. O programa de contrapartidas dos submarinos era longo, era um programa para 8 ou 10 anos, e o grau de execução do primeiro ano foi considerável, face à natureza dos projetos relacionados com os Estaleiros de Viana, mas, como lhe digo, preferia que questões de natureza mais técnica, para serem respondidas com mais rigor e com mais clarividência, fossem colocadas ao Eng.º Rui Neves, porque, assim, beneficiaria muito, creio eu, a informação que a Comissão procura.

O Sr. Presidente: –Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Semedo (BE): – Aliás, julgo que o Eng.º Rui Neves é ouvido hoje, não é?

O Sr. Presidente: – É.

O Sr. João Semedo (BE): – Pronto, até se dá a feliz coincidência…

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O Sr. Presidente: – Será ouvido imediatamente a seguir ao Sr. Dr. Luís Amado. Portanto, pode continuar a linha do questionário.

O Sr. João Semedo (BE): – Não sei se essa programação é fruto e filha do acaso, mas, caso não seja filha do acaso, tenho que cumprimentar o Sr. Presidente por essa feliz coincidência.

O Sr. Presidente: – É fruto do acaso, mas eu não o quero assumir.

Risos.

O Sr. Presidente: – Pode continuar, Sr. Deputado.

O Sr. João Semedo (BE): – Seja como for, felicito-o na mesma.

As minhas duas últimas perguntas são aquelas a que me referi no início e a primeira é se sim ou não, enquanto Ministro da Defesa, confirmou que, no seu Ministério, havia alguns documentos relacionados com estes processos de aquisição de equipamento militar ou das respetivas contrapartidas que tivessem desaparecido do arquivo do Ministério.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Doutor.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Sim, tanto quanto sei, houve problemas com documentos.

Quando o Ministério Público, a partir de certa altura, interveio no processo, lembro-me que tivemos alguma dificuldade relativamente a alguns documentos, que, entretanto, creio, tiveram seguimento por parte das autoridades que investigaram alguns aspetos relacionados com esses

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programas: Mas apenas isso e só na sequência disso. Não fui eu que fui verificar se os contratos e se os documentos estavam nos respetivos…

Sabe que os Ministérios, em particular os Ministérios de soberania – e eu estive, pelo menos, em três deles –, são Ministérios que têm um sistema de organização de segurança e de eficiência no desempenho das suas funções que está muito para lá dos governos de turno. Encontrei isso no Ministério da Administração Interna, encontrei isso no Ministério dos Negócios Estrangeiros e encontrei no Ministério da Defesa e, portanto, não tinha que me preocupar com aspetos relacionados com situações desse tipo.

Mas, de facto, houve, pelo menos, uma situação decorrente de um inquérito ou de uma investigação em que houve dificuldade em encontrar um determinado contrato, embora não lhe possa precisar exatamente o que foi. Aliás, esse ruído estava na comunicação social, à época.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Semedo (BE): – Posso concluir das suas palavras que não se tratou exatamente e apenas de um ruído, foi um caso real, uma situação real. E a minha pergunta é se isso mereceu da parte do Ministro ou da equipa do Ministério a abertura de algum inquérito para esclarecimento desse problema.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Doutor.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Não lhe posso precisar exatamente que tipo de reação tivemos nessa circunstância. Confesso que não lhe posso precisar, exatamente, se houve ou não uma iniciativa nesse sentido.

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O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Semedo (BE): – E a quem é que o Sr. Dr. Luís Amado acha que se pode fazer essa pergunta?

O Sr. Dr. Luís Amado: – Não faço ideia, pergunte a quem entender. Acho que a Comissão tem esse mandato, acho que pode fazer as perguntas todas que entender fazer, agora, eu também tenho direito à memória e, nesse aspeto, prefiro ser rigoroso na resposta às questões que me são colocadas pelo Deputados do que estar, de forma evasiva, a esconder a minha falta de memória. É exatamente o que se passa nesta situação, não tenho ideia de que tipo de procedimento ou se houve procedimento adotado relativamente a essa situação, em concreto.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Semedo (BE): – Compreendi a sua resposta e ela foi rigorosa e clara. Nem sequer estava a fazer qualquer interpretação sobre ela, mas estava apenas a perguntar, na circunstância de o Dr. Luís Amado não se recordar, o que acho perfeitamente normal, a quem é que nós devemos dirigir essa pergunta. Presumo que ao secretário-geral do Ministério ou qualquer coisa no género. A minha pergunta era nesse sentido e não era ouvi-lo sobre quem é que eventualmente…

A última pergunta, então, era a seguinte: alguma vez, enquanto Ministro da Defesa, se encontrou com o cônsul português em Munique, o Sr. Adolf Jurgen.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Doutor.

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O Sr. Dr. Luís Amado: – Pelo menos uma vez. Ele estava no aeroporto, numa viagem em trânsito.

O cônsul fazia o que fazem, normalmente, os cônsules nestas funções. Às vezes, quando o trânsito é a más horas, o Ministério, aliás, usa muito esse crivo para avaliar, muitas vezes, o comportamento dos cônsules. Ele era um cônsul honorário e não tinha essa responsabilidade, mas, de facto, estava no Ministério.

Era uma pessoa muito simpática, estava até com a mulher, e estivemos, provavelmente, mais de uma hora à conversa e a tomar chá no aeroporto de Munique, num trânsito não sei para onde, não lhe posso precisar. Mas, lá está, quanto a essas respostas, os ministérios, como o Ministério da Defesa, têm essa informação toda registada e, portanto, poderão precisar exatamente o dia em que esse encontro ocorreu.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Semedo (BE): – Como o Dr. Luís Amado deve ter reparado, este cônsul é motivo de interesse desta Comissão e, sobretudo, tem muita simpatia nas bancadas da direita, como se percebeu pela reação que tiveram às suas palavras. Mas há um pequeno detalhe que, apesar de tudo, tem de ser sublinhado: o Dr. Luís Amado considerou-o uma figura simpática, o Dr. Paulo Portas admitiu que ele fosse um pouco maçador. Seja como for, não é, com certeza, uma diferença muito relevante mas não queria deixar de a referir.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Doutor, ainda para um comentário final.

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O Sr. Dr. Luís Amado: – É ainda em relação ao cônsul.

O cônsul foi muito simpático. Estou a recordar-me que a senhora era pintora, tinha uma casa no Algarve — já agora, é mais uma informação — e mostrou-me o catálogo de uma exposição que tinha feito no Algarve; ele sabia que eu também tinha alguma inclinação artística e, portanto, lembro-me que essa conversa foi uma conversa agradável, entre um chá e o tempo de espera. É o registo que guardo. Depois, associei, naturalmente, ao episódio que marcou a sua condenação.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Semedo (BE): – Aliás, se me permite, julgo que foi exatamente no tempo em que o Dr. Luís Amado era Ministro dos Negócios Estrangeiros que esse cônsul foi suspenso e, posteriormente, demitido.

Julgo que foi ainda no seu tempo de Ministro da Defesa.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Sim, quando os acontecimentos o justificaram, quando eu era Ministro dos Negócios Estrangeiros, exatamente.

O Sr. João Semedo (BE): – Sim, corrijo, porque disse «Ministro da Defesa» quando queria dizer Ministro dos Negócios Estrangeiros. Foi nesse tempo.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Exatamente. Quando os factos vindos a público não justificavam, de forma alguma, ter em funções honorárias um

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cônsul com a acusação que sobre ele pendia e, portanto, a decisão foi tomada de imediato pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Presidente: – Muito obrigado, Sr. Dr. Luís Amado; muito obrigado, Sr. Deputado João Semedo.

Segue-se, na ordem das perguntas, o Partido Social-Democrata, que dispõe também de 10 minutos.

Presumo que seja a Sr.ª Deputada Francisca Almeida a formular as perguntas.

Faz favor, Sr.ª Deputada. Tem 10 minutos.

A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): – Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Dr. Luís Amado, queria, antes de mais, cumprimentá-lo e agradecer-lhe os esclarecimentos que já nos prestou e aqueles que ainda nos poderá prestar, nesta Comissão.

Aproveito, desde já, para citar uma notícia, à data, revelada pela comunicação social, que o Sr. Deputado João Semedo já aqui tinha citado, de que o Dr. Luís Amado, quando tomou posse como Ministro da Defesa, deu uma entrevista ao Expresso em que dizia (cito e posso distribuir, se necessário for) «contrapartidas de Portas são um embuste». E à pergunta «as contrapartidas relativas às aquisições não sofrem alterações», responde «estamos a reavaliar os programas de contrapartidas em relação a todos os casos, o regime que tem sido desenvolvido é um embuste».

Confesso que esta declaração é, do meu ponto de vista, uma declaração grave e, dos esclarecimentos que aqui já nos prestou, não me parece que, no decurso do seu mandato, tenham sido retiradas consequências condizentes com a gravidade destas declarações ou, pelo menos, com a seriedade desta declaração. Portanto, a primeira pergunta que

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lhe faço é esta: quais é eram, em concreto, as principais situações de incumprimento que encontrou, à época, quando tomou posse?

O Sr. Presidente: – Faz favor, Sr. Doutor.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Sr.ª Deputada, já respondi, em parte, a essa questão, já justifiquei que uma coisa é o título, outra coisa é exatamente a expressão que eu utilizo.

A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): – Por não ter falado ao microfone, não possível transcrever as palavras da orador.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Eu utilizei a expressão «o regime de contrapartidas é um embuste» e não fiz referência ao Ministro de uma forma acintosa.

Precisamente porque essa é a função do jornalista, as entrevistas, como os Srs. Deputados sabem, são sempre um compromisso entre o jornalista e o político e o título é a zona cinzenta de compromisso, é a zona excitante de compromisso, que justifica, muitas vezes, a entrevista.

Mas, na altura, eu próprio, como lhe disse, com o Dr. Paulo Portas, com quem tenho uma relação pessoal que é conhecida, que é boa, justifiquei, porque acho que devemos preservar o equilíbrio nas relações pessoais quando estamos em funções públicas e eu tive sempre essa preocupação. Por isso, a justifiquei e, há pouco, mencionei esse facto.

«O regime é um embuste» do ponto de vista, como eu justifiquei, do que é a doutrina adotada para negociar contrapartidas de aquisição de equipamentos militares de grande impacto no Orçamento e no erário público quando os projetos decorrentes dos diferentes programas de

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contrapartidas não têm coerência, não têm consistência, não têm a relação com os objetivos definidos. E foi essa a situação que encontrámos. Mas, repare, essa entrevista não é do início do meu mandato, essa entrevista deve ser do início de 2006, porque foi já depois…

A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): – É de junho de 2005!

O Sr. Dr. Luís Amado: – De junho de 2005?!

A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): – Sim, sim!

O Sr. Dr. Luís Amado: – Então, desculpe, estou eu enganado. Tinha ideia que tinha dado essa entrevista mais tarde. Mas creio que já estava aí anunciado o estudo que eu tinha mandado fazer precisamente para fazer a avaliação dos programas de contrapartidas e as alterações que tinha proposto em matéria de funcionamento da comissão de contrapartidas.

A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): – Por não ter lado ao microfone, não foi possível transcrever as palavras da oradora.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Tenho a ideia que sim, mas confirmará isso, seguramente, depois.

A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): – Mas posso distribuir, se necessário for. Justamente porque, por vezes, o título pode não corresponder exatamente àquilo que se diz é que fiz questão de citar a resposta que, com concreto, foi dada.

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Ainda assim, e bem sabendo que, concretamente, foi alterada orgânica da Comissão Permanente de Contrapartidas e que, como já fez questão de aqui nos dizer (e vou citar aquilo que disse) «renegociámos muitos destes contratos», perguntava-lhe, por um lado, quais eram as taxas de execução que encontrou e aquelas que deixou, no final do seu mandato, e, em concreto, se renegociou, o que é que foi renegociado. Foram acionadas garantias ou não? Em concreto, o que é que foi feito nesta matéria?

De facto, já aqui teve oportunidade de responder sobre isto ao Sr. Deputado João Semedo em termos abstratos mas eu gostava de perceber, em concreto, o que é que foi feito relativamente a cada um dos programas. Se se recorda, gostava de perceber um bocadinho o que é que foi feito relativamente a cada um dos programas.

O Sr. Presidente: – Dr. Doutor, tem a palavra.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Sr.ª Deputada, não posso dizer mais do que disse ao Sr. Deputado João Semedo. Acho que, relativamente às questões da minha competência de caráter decisório político, fiz o que entendi que devia fazer. Introduzi algumas correções estruturais no sistema vigente de contrapartidas, uma orientação em relação à renegociação de alguns dos contratos que eram possíveis de renegociar, uma Comissão de Contrapartidas com outra capacidade técnica, profissionalizada e articulada com o Ministério da Economia, precisamente porque muitos dos projetos visavam ter impacto no desenvolvimento da economia e em alguns setores de tecnologia que pretendíamos, naturalmente, valorizar na negociação desses programas. Foram essas orientações que foram assumidas.

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Agora, em concreto, o que é que foi feito, isso era da responsabilidade da comissão de contrapartidas e eu, como compreende, nesse curto período em que estive em funções, não estive no dia a dia a fazer a gestão dos programas de contrapartidas. Mas dada a circunstância feliz de terem aqui o Eng.º Rui Neves dentro de algum tempo, poderão, naturalmente, esclarecer com ele o que é que foi feito, em concreto, nos diferentes programas. Estou certo que, no âmbito das suas responsabilidades, terá a memória muito mais viva do que eu em relação ao que foi feito.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): – Sr. Dr. Luís Amado, percebo que, no dia a dia da Comissão Permanente de Contrapartidas e, ainda mais, no modelo que, depois, foi gizado no decurso do seu mandato, não haja uma intervenção, se quiser, diária ou contínua do Ministério. Compreendo isso, mas também compreendo que a questão das contrapartidas é, por natureza, uma questão quente, um tema quente, se quiser – acho que é um adjetivo que posso usar —, no dia a dia, se quiser, até da relação do Ministério da Defesa com as questões que estão mais candentes na imprensa ou até no próprio Parlamento.

Portanto, custa-me a acreditar que o Ministério da Defesa não acompanhasse, pelo menos, esta matéria, no que diz respeito ao outcome das coisas que vão sendo feitas na Comissão Permanente das Contrapartidas — pelo menos no que diz respeito ao resultado daquilo que vai sendo feito. Assim, perguntava-lhe: então, como é que avalia o desempenho da Comissão Permanente de Contrapartidas no decurso do seu mandato?

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O Sr. Presidente: – Faça favor, Sr. Doutor.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Naturalmente que o Ministério acompanha. A Comissão de Contrapartidas era tutelada pelo Ministério da Defesa. Agora, o que lhe estou a dizer é que a senhora está a pedir-me que eu diga, em concreto, que avaliação fazia da execução, a taxa de execução de cada programa, do que se passou há 10 ou 8 anos atrás. Não tenho isso de memória.

Naturalmente que, quando reunia com o presidente da comissão de contrapartidas, ele informava-me. Mas a memória sobre a execução de cada programa, no primeiro ano do mandato do Governo, quando o que estava em causa no meu espírito era agir politicamente no sentido de introduzir as correções estruturais que o sistema exigia, o detalhe, como calcula, não está fresco na minha memória.

Acredito que, no dia a dia da gestão corrente do Ministério e da relação com o presidente da comissão de contrapartidas, esse exercício ia sendo feito, mas, agora, não estou em condições de lhe poder estar a dizer qual foi a taxa de execução que houve sobre cada programa.

Do ponto de vista estrutural, foi feito um esforço no sentido de introduzir alguma correção; se foi no bom ou no mau sentido, não cabe a mim, naturalmente, avaliar. Mas, relativamente, em concreto, à execução de cada um dos programas…

Acho que, no conjunto, na avaliação do que foi feito na Comissão Permanente de Contrapartidas durante o período que estive em funções, sobressaem aspetos muito positivos, que têm que ver, designadamente com a preparação, por exemplo, do único contrato que foi feito enquanto estive em funções, contrato assinado por mim, na presença do Ministro das Obras

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Públicas, Transportes e Comunicações e do Ministro da Economia, do avião que substituiu o aviocar e onde beneficiámos muito do trabalho de avaliação que a comissão de contrapartidas foi fazendo de experiências anteriores. Por exemplo, nesse dia, foram assinados, simultaneamente, os cinco contratos, o que deu outra consistência ao pacote de negociação que foi feito.

Portanto, esse trabalho de avaliação foi sendo feito, naturalmente, ao longo da gestão, no período em que estive no Ministério, mas, no concreto, não estou em condições de lhe transmitir outra informação.

O Sr. Presidente: – Sr.ª Deputada, tem a palavra.

A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): – Dr. Luís Amado, perguntava-lhe

e esta pergunta já foi feita por mim e por outros Deputados a anteriores Ministros da Defesa – como é que era, no dia-a-dia, a relação entre o Ministro da Defesa, no fundo, a tutela, e a Comissão Permanente de Contrapartidas, quer com aquela que encontrou quando tomou posse, quer com a nova, no sentido da nova estrutura orgânica, que criou no curso do seu mandato?

O Sr. Presidente: – Faz favor, Sr. Doutor.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Era muito constante, como há pouco disse, era um tema naturalmente quente. Eu próprio o coloquei nesses termos na relação que estabeleci com a imprensa, como, aliás, sublinhou logo, no início da sua intervenção. Portanto, era um setor que acompanhávamos com atenção, do ponto de vista político; reuníamos — o Eng.º Rui Neves dar-lhe-á conta disso — e acompanhávamos muito os dossiês mais

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importantes, que estavam em causa ainda com muitos aspetos pendentes de fecho da negociação e com interesses consideráveis em causa.

Mas também lhe direi que a minha preocupação era introduzir – isso, aliás, sobressai, seguramente, da entrevista, se é aquela em que estou a pensar – uma linha de partilha de tutela e de responsabilidade, que não foi bem acolhida no Ministério da Defesa e, em particular, no setor militar. Tratava-se de introduzir uma linha de tutela do Ministério da Economia relativamente à gestão dos programas das contrapartidas, no entendimento exato de que o planeamento estratégico de investimentos ou de contrapartidas em diferentes setores da economia portuguesa não podia derivar de uma avaliação isolada que o Ministério da Defesa fizesse, ou de uma negociação fechada e centrada apenas na visão que o Ministério da Defesa tinha, embora houvesse, como lhe disse, de início, uma corrente que sempre defendeu que as contrapartidas deveriam estar até no Ministério da Defesa porque elas deviam ter incidência sobretudo nas indústrias da defesa e no seu upgrade, no seu desenvolvimento. Mas como essa não era a doutrina que estava, de facto, plasmada nas negociações que tinham sido feitas e nas expectativas que tinham sido criadas com diferentes setores da atividade económica, entendi, justamente por isso – e foi essa a minha preocupação – que esse processo e a tutela da Comissão passasse também para o Ministério da Economia, ficando com dupla tutela e, portanto, era partilhada essa responsabilidade com o Ministério da Economia.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): – Sr. Dr. Luís Amado, compreendo que me diga que, de facto, essa relação era estreita e era uma

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relação de colaboração contínua, mas, de facto, tenho dificuldade em identificar uma situação de incumprimento ou uma renegociação de monta.

Posso dar como exemplo, no atual Governo, a renegociação que diz respeito ao hotel Alfamar, com o que podemos estar de acordo ou não, mas custa-me a crer que o Ministro da Defesa ou o Ministro da Economia, daqui a 10 anos, não se consigam lembrar que levaram a efeito essa renegociação.

Portanto, volto a insistir na pergunta: existiu alguma renegociação pelo menos desse calibre, dessa monta ou digna de nota no curso do seu mandato?

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Doutor.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Insisto na resposta, Sr.ª Deputada. O Eng.º Rui Neves aí virá. Ele conduziu essas negociações e terá oportunidade de esclarecer com ele os aspetos dessas renegociações que foram feitas, e foram muitas e significativas como ele terá oportunidade de lhe transmitir, seguramente.

Ora, não lhe vou transmitir ideias difusas que tenho sobre programas cujos nomes já confundi. Já exerci muitas funções depois disso e a Sr.ª Deputada, com certeza, não tem responsabilidade ou nunca teve responsabilidade de governo em momentos de crise e de tensão em que esses aspetos são relevantes e mais relevantes do ponto de vista político do que de detalhes da governação e do dia a dia.

O Eng.º Rui Neves tinha essa responsabilidade, era o presidente da comissão de contrapartidas, foi ele que conduziu essas negociações e, daqui a duas horas, satisfará, seguramente, a sua curiosidade. Estou certo que ele tem esses temas na sua memória, eu não os tenho porque tenho a distância

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política e, como a Sr.ª Deputada já frisou, tenho fraca memória — já o disse não preciso de o repetir.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): – Acho que, quanto a isto, não ficamos esclarecidos, mas ficamos esclarecidos quanto aos esclarecimentos que o Dr. Luís Amado aqui nos pode trazer.

Passava para uma outra questão, que foi colocada também aos anteriores Ministros da Defesa que passaram por esta Comissão e que tem a ver, justamente, com uma questão que também aqui referiu e que acho que é pertinente.

Foi feito aqui, no fundo, um shifting daquilo que se pretendia das contrapartidas no curso do seu mandato. Por exemplo, o ex-Ministro Castro Caldas, quando cá esteve, classificou de «catástrofe» para a indústria portuguesa a negociação das contrapartidas para a compra dos submarinos alemães, sem ter em conta o potencial dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo; o ex-Ministro Rui Pena considerou (e estou a citar) «negativa a primazia dada às contrapartidas propostas pelos fornecedores de equipamento militar ao Estado português por beneficiarem outros interesses que não os daquele setor de atividade»; o ex-Ministro da Defesa Jaime Gama mostrou-se pouco favorável a contrapartidas, para o Estado português, negociadas com fornecedores de equipamento militar e defendeu compras exclusivamente tendo em conta as necessidades das Forças Armadas. Percebemos agora que, no curso do mandato do Dr. Luís Amado, há aqui uma perspetiva diferente — creio ter percebido bem —, que é a de que as contrapartidas podem não só beneficiar exclusivamente as

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Forças Armadas mas a economia como um todo. Creio ter percebido corretamente.

Pergunto-lhe qual foi, no fundo, o racional dessa decisão ou se isso implicou apenas um assumir daquilo que já tinha sido negociado anteriormente?

O Sr. Presidente: – Sr. Doutor, tem a palavra.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Voltamos ao «embuste». O «embuste» tem que ver com isso, Sr.ª Deputada.

Independentemente do meu juízo, a doutrina que emergia dos contratos de contrapartidas que estavam negociados e que herdei, era uma doutrina que se orientava não no sentido da concentração das contrapartidas no desenvolvimento das indústrias de defesa mas no sentido de um impacto em diferentes setores da atividade económica, tendo, aliás, sido geradas muitas expetativas em alguns desses setores.

Portanto, a minha preocupação quanto a isso, como acabei de dizer, foi justamente trazer uma comissão de contrapartidas, que tinha herdado um conjunto de programas com essa doutrina, mais aberta relativamente aos diferentes setores da economia que podiam beneficiar dessas contrapartidas, para a tutela do Ministério da Economia, ou melhor, trazer o Ministério da Economia para a tutela da orientação relativamente à comissão de contrapartidas, para o acompanhamento dos seus programas e para a definição, no âmbito de uma comissão de contrapartidas que tinha também um vice-presidente nomeado pelo Ministério da Economia, que tinha uma visão dos interesses estratégicos da economia.

Portanto, o embuste está, justamente, nessa situação: não bate a bota com a perdigota. Tínhamos uma doutrina aberta relativamente ao impacto

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que as contrapartidas poderiam ter no desenvolvimento de diferentes setores da economia, mas, depois, os programas não satisfaziam muitas das necessidades decorrentes da definição de objetivos que constavam desses programas.

Portanto, havia um problema estrutural, na minha leitura. Podia estar equivocado e posso ter estado equivocado, mas, na minha leitura, não fazia sentido pretender utilizar volumes consideráveis de investimento em diferentes setores da economia portuguesa, mal definidos, mal estabelecidos, com critérios pouco rigorosos e, depois, fazer isso no círculo fechado do Ministério da Defesa, que não conhece a realidade da economia do País, não conhece o tecido industrial. Portanto, a minha preocupação foi estrutural e disse-o de imediato: temos que pôr a tutela da Economia no acompanhamento de programas que têm por objeto a modernização da economia portuguesa e o impacto direto na inovação tecnológica em alguns desses setores. Foi isso que foi feito.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): – O Dr. Luís Amado, no curso do seu mandato, aprovou uma nova Lei de Programação Militar, que reduzia substancialmente a possibilidade de recurso ao leasing para aquisição de equipamentos.

Ora, a possibilidade de recurso ao leasing para aquisição de equipamentos de defesa – e isso já foi aflorado aqui, nesta Comissão – foi possibilitada pelo anterior Ministro Jaime Gama, que, de resto, lançou o concurso dos EH-101, que, por sua vez, foram comprados através da figura da locação operacional.

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Pergunto se, no curso do seu mandato, teve a possibilidade de avaliar a forma como a locação foi utilizada neste programa.

O Sr. Presidente: – Faz favor, Sr. Doutor.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Nós usámos o mesmo procedimento, depois, no contrato relativo ao avião que substituiu o aviocar, o C-295, e o contrato de locação financeira foi… Eu sei que, depois, as regras do Eurostat mudaram e os governos que se seguiram ficaram limitados nesse procedimento, mas creio que, poucos meses antes ou talvez meio ano antes, esse contrato foi fechado. E, como disse, o contrato de locação foi assinado ao mesmo tempo do contrato de contrapartidas e do contrato de aquisição do equipamento e, portanto, utilizámos nessa mesma figura e não houve qualquer exercício de avaliação crítica em relação ao sistema adotado na aquisição anterior.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): – Pergunto isto não tanto pela circunstância de ter sido operado o recurso ao leasing mas porque o Tribunal de Contas, em 2012, veio chamar a atenção para a forma como a repartição do risco teve, aqui, lugar. E vou citar, para não incorrer aqui em nenhum erro.

Disse o Tribunal de Contas, em 2012: «Para o fornecimento dos EH-101, em análise, operou-se pela figura da locação operacional e não pela locação financeira. Contudo, os critérios da locação não são cumpridos na sua plenitude porque não há transferência de risco nem operacional nem, em parte, financeiro. Não há transferência de risco operacional porque o

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Estado é simultaneamente locatário e indiretamente locador, através da DEFLOC, que é adquirente meramente formal, face à AgustaWestland, e não tem competências nem capacidades que satisfaçam os requisitos mínimos de um locador operacional. E há transferência parcial de risco financeiro porque a DEFLOC é locadora formal por ter cedido os créditos de locação a um sindicato bancário em que participa a Caixa Geral de Depósitos».

Portanto, perguntava-lhe se, à data — este relatório é só de 2012 —, foi feita alguma análise sobre a forma como, em concreto, a locação foi desenhada estruturalmente neste programa de compra.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Doutor.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Não, da minha parte, não foi. Como lhe disse, o contrato seguinte foi também um contrato de locação financeira, o contrato do…

A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): – Do C-295!

O Sr. Dr. Luís Amado: – Sim, do C-295. Foi o único contrato que assinei e devia ter decorado o nome do equipamento, mas ainda não o decorei. Como vê, tenho mesmo fraca memória, Sr.ª Deputada!

Mas, de facto, esse juízo do Tribunal de Contas é de 2012 e a questão, na altura, não se colocava.

O Sr. Presidente: – A Sr.ª Deputada dispõe de…

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A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): -Já terminei, Sr. Presidente. Muito obrigada.

O Sr. Presidente: – Segue-se, nesta primeira ronda, o Partido Socialista, que dispõe também de 10 minutos.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): – Sr. Presidente, também gostaria de cumprimentar o Dr. Luís Amado, com uma declaração de interesses, uma vez que somos correligionários e amigos e estivemos nos dois governos que precederam o atual.

Feitos os esclarecimentos constantes dos autos, gostaria de voltar à questão das condições que encontrou na altura em que foi assumido o mandato, no XVII Governo.

Este inquérito visa, apenas, apurar se o interesse público foi bem defendido, se houve anomalias nas relações com os fornecedores, quais foram as vicissitudes que o comportamento dos fornecedores criou para o Estado, em matéria de contrapartidas e outras, e é neste âmbito e não no âmbito jurídico-criminal que situamos os trabalhos, como é da lei, e, portanto, é importante regressar a essas condições.

Sintetizou o juízo sobre o início do mandato em dois pontos: não pôr em causa os programas, até porque eles constavam de uma Lei de Programação Militar que tinha sido aprovada por consenso alargado, embora com uma distância do PSD em 2001, que votou contra, tendo feito a rattrapage em 2003, altura em que estava no governo, e, portanto, a questão da correção estratégica das aquisições não foi posta em causa porque correspondia a problemas reais. No entanto, preparou a revisão da Lei de Programação Militar, que não chegou a completar-se no mandato,

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mas ainda veio defender, na generalidade, se bem me lembro, ao Plenário da Assembleia esse novo enquadramento. E, nesse novo enquadramento, a taxa de leasing baixava de 52% para cerca de 41%.

Será capaz de recordar por que é que se chegou a essa conclusão sobre a viabilidade de o fazer?

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Doutor.

O Sr. Dr. Luís Amado: – O que recordo desse exercício é a sua complexidade, a grande dificuldade em fechar as diferentes «casas» do puzzle e creio que essa era uma condição de partida, ou seja, a redução do financiamento por leasing dos diferentes programas que compunham a Lei de Programação Militar. Portanto, essa era uma orientação de princípio relativamente à necessidade de corrigir a lei anterior.

Lembro-me que, à partida, de entre os vários objetivos de correção que se previam, esse da redução da margem de financiamento do leasing era um deles. Não recordo exatamente os montantes que foram considerados, mas recordo que havia esse objetivo precisamente porque a lei anterior estava excessivamente alavancada nesse procedimento técnico do leasing.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): – Esse é um ponto importante porque estamos, no fundo, a rastrear a evolução da posição do legislador. É um autoexame, em certo sentido, mas, como essa alteração foi feita em conjunturas políticas totalmente diferentes, é importante ter uma ideia de como é que foi evoluindo. Foi evoluindo no sentido da restrição e, aliás,

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essa Lei de Programação Militar veio a admitir outra coisa: a alienação de material militar como forma de criação de receitas, processo que veio, aliás, a ocorrer historicamente, recentemente.

Teve algum peso nessa reavaliação o facto de ter tido ocasião de analisar a cascata de contratos que, por exemplo, no caso dos submarinos, levou a que houvesse um contrato de aquisição, um contrato de contrapartidas e um contrato financeiro. Esse contrato financeiro permitiu a um consórcio bancário assumir encargos, funcionar como entidade swap e permitir ao Estado português pagar até bem longe, na década de 20 deste século.

Tem memória dessa reavaliação ou dessa análise?

O Sr. Presidente: – Faça favor, Sr. Doutor.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Tenho a memória de que essa situação, que, aliás, veio a integrar os pareceres do Tribunal de Contas mais tarde, como há pouco foi referido, decorria justamente dessa avaliação. O contrato dos submarinos foi um contrato extremamente complexo do ponto de vista da sua negociação, da sua génese, do seu financiamento, também dado o montante elevadíssimo que ele comportava.

Portanto, desde o início que, numa linha de crítica ao que era a situação da lei de programação anterior, às pessoas que tecnicamente prepararam o documento da Lei de Programação Militar, que foi muito difícil de fechar, como se lembram, se exigiu essa orientação: tinha de se reduzir a margem de financiamento por recurso a locação financeira. Daí até a necessidade de introduzir, pela primeira vez, uma linha de receita decorrente de alienação de material militar, precisamente para fechar o equilíbrio da lei no seu conjunto, e, como sublinhou, creio que foi a

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primeira vez que a Lei de Programação Militar assumiu a venda de equipamento militar. Digamos que junto das Forças Armadas, junto de um ou outro ramo, não foi fácil assumir essa contrapartida, mas era também a necessidade, como disse, de corrigir um excesso de adoção de procedimentos que, como se veio a verificar mais tarde, seriam objeto, futuramente, de crítica do Tribunal de Contas.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): – Não foi considerada a possibilidade de

virando-nos agora para a questão do dossiê contrapartidas – renegociar o contrato de contrapartidas herdado e que tinha, ele próprio, aquilo a que o Dr. Santos Pereira chamou «um passivo reputacional», que é uma expressão, enfim, um pouco sui generis mas que ele lançou já em 2012 e que, hoje, retomou connosco. Não considerou a hipótese de renegociar as contrapartidas? O que estava em causa era a execução?

O Sr. Presidente: – Faz favor, Sr. Doutor.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Na avaliação que foi feita, foi justamente esse aspeto que foi tido em conta, a execução era já muito elevada no primeiro ano de execução do programa e o programa era a oito anos. Não me lembro exatamente dos valores da execução que o programa tinha …

O Sr. José Magalhães (PS): – Tendo em conta as pré-contrapartidas.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Sim, tendo em conta as pré-contrapartidas.

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Lembro-me que o primeiro exercício de avaliação que foi feito foi justamente impressivo — eu até tinha sido eleito por Viana do Castelo, creio, e foi nesse mandato — e, como era muito impressivo o grau de execução do primeiro ano, sendo um programa a oito anos, não mereceu, da nossa parte, nenhum esforço particular, creio eu.

Não tenho a memória viva sobre o que discutimos nessa fase — cá está mais uma questão que poderá ser colocada na audiência seguinte —, mas tenho ideia — é o que registo de memória — que a execução era considerável e, por isso, não oferecia, em particular, uma preocupação relevante no primeiro ano de execução do programa de contrapartidas — é do ano de que estamos a falar.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): – Em relação à questão do regime das contrapartidas, já tinha saído do Governo quando foi publicado o Decreto-Lei n.º 153/2006 mas, na verdade, ainda participou no Conselho de Ministros que o aprovou e a publicação ulterior…

O Sr. Dr. Luís Amado: – Foi trabalhado durante o nosso mandato.

O Sr. José Magalhães (PS): – Exatamente. E a publicação ulterior, como dizia, resultou, pura e simplesmente, do período de promulgação.

Este restart foi anunciado intensamente. Lembro que isto sai em agosto e no mês de fevereiro tinha ido, na companhia do Ministro da Ciência, visitar um dos polos científicos, tendo anunciado que haveria um novo modelo da gestão estratégica do setor das indústrias da defesa, com uma cotutela do Ministério da Economia, nos termos que acabou de evocar

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aqui. E dava como exemplo não qualquer contato com os parceiros alemães mas o exemplo da Espanha e dos resultados que a indústria espanhola tinha conseguido obter com esse modelo, que procurava importar.

Foi assim? Portanto, houve um peso concreto do sucesso espanhol de várias centenas de contratos conseguidos e com resultados comprovados?

O Sr. Dr. Luís Amado: – Sim, lembro-me de que esse processo foi bastante estudado e acompanhado, houve um debate mesmo na Comissão de Defesa, que me lembre, relativamente à EADS, no âmbito do processo de discussão relativamente ao futuro do avião estratégico, a substituição, a prazo, do C-130 e, portanto, a entrada ou não entrada no consórcio do A-400M.

Houve um debate muito vivo sobre essa reorientação em relação ao futuro do transporte estratégico português, nessa primeira fase. Ele esteve presente no debate da Lei de Programação Militar, embora se tenha deixado para mais tarde uma opção de fundo relativamente a essa matéria. Mas nós conhecíamos o impacto, que já era evidente em muitos setores da indústria espanhola, decorrente de uma doutrina coerente, consistente e estável de negociação de contrapartidas em matéria de equipamentos militares e muita da comparticipação importante de setores da indústria espanhola na indústria de defesa europeia decorrem, em grande medida, de opções de políticas de fundo que foram tomadas pelos governos espanhóis e que fazem com que a Espanha, hoje, tenha um peso considerável, apesar de tudo, no conjunto da indústria europeia, em alguns setores importantes, designadamente em equipamentos militares, nos setores quer da força aérea quer da marinha.

O Sr. Presidente: – Faz favor, Sr. Deputado.

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O Sr. José Magalhães (PS): – Pelas razões que há pouco invocou, não lhe faço perguntas sobre o juízo de avaliação do impacto do programa,

  1. um juízo que a Comissão terá de fazer, mas gostava de lhe fazer uma pergunta sobre um outro dossiê, o dossiê dos torpedos.

Em matéria de torpedos, o contrato de aquisição previu um prazo muito curto, de seis meses, para o Estado português fornecer ao consórcio alemão as especificações pelas quais tinha optado. Tinha celebrado um contrato com a empresa italiana WASS, que forneceu um determinado tipo de torpedos, tendo-se verificado — mas isso num período que exerceu o exercício de suas funções no Ministério da Defesa Nacional — que havia um grau zero de contrapartidas aceites e apenas 3,9 milhões de euros de contrapartidas propostas. Esse contrato veio a ter garantia bancária efetivada.

Tem alguma memória de problemas posteriores à contratação desta empresa para o fornecimento dos torpedos? Tem alguma ideia sobre o que

  1. que se decidiu e fez em matéria de manutenção dos torpedos? É que, por pouco que isso aflore à imaginação das pessoas, esse equipamento carece de manutenção, sob pena de não funcionar na altura em que for preciso. Essa questão foi colocada e teve algum peso ou não teve qualquer peso?

O Sr. Dr. Luís Amado: – Não tenho documentação nenhuma; naturalmente, saí do Ministério como entrei, sem nenhum documento de referência relativamente ao tempo em que aí estive em funções.

O que tenho de memória é algum ruído relativamente a esse contrato, como relativamente a outros. Há sempre controvérsia nestes sistemas de armas e de equipamentos, há diferentes opções. Mesmo dentro das Forças Armadas, como sabe, há grupos de interesses que têm opções diferentes e

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tenho ideia do ruído, mas não tenho informação detalhada que lhe possa dar sobre nem o primeiro nem o segundo aspeto da sua questão, com muita sinceridade.

O Sr. José Magalhães (PS): – Sobre esta última questão, devo dizer-lhe – porque a pergunta seria sugestiva sem isso – que não descobrimos, até à data, que haja qualquer contrato de manutenção. A esta hora mesmo! E sendo um contrato que só pode ser feito por ajuste direto, porque não há manutenção feita por entidade diferente daquela que vende os torpedos em causa e precisando eles de estar operacionais, essa é uma questão que está em aberto.

A pergunta visava só reconstituir se tinha memória de alguém, nessa altura, ter vindo alertar para que era necessário fazer um contrato de manutenção, sob pena de, na altura em que for necessário disparar algum, o que custa bastantes milhões de euros, se verificar, como aconteceu, recentemente, num exercício militar, que nenhum dos oito disparos atingiu o alvo por os alvos já estarem fora de prazo, o que pode acontecer e acontece quando não há manutenção ou quando o material está fora de prazo — não funciona! É uma lei dura, mas é.

Portanto, estava só a procurar apurar se tinha havido algum alerta nesse sentido ou se não houve.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Tenho, como lhe disse, o ruído de que esse problema, no conjunto dos muitos problemas com que lidámos, na altura, foi aflorado. Lembro-me vivamente da grande preocupação que houve em relação ao contrato de manutenção do helicóptero EH-101. Esse, sim, foi um processo que, praticamente, se prolongou por todo o meu mandato de

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15 meses no Ministério, dada a situação de os helicópteros estarem a operar e, ainda dentro da garantia, se ter de negociar o contrato de manutenção.

Portanto, a manutenção do EH-101 foi, de facto, um problema que foi bastante debatido com a comissão de contrapartidas e recordo que foi encarregue, especificamente, uma pessoa para preparar esse contrato de manutenção, mas, relativamente ao torpedo, apenas um ruído de fundo,… não tenho detalhe da informação sobre essa situação.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): – A outra questão é sobre outro dossiê, dos que são objeto de análise da Comissão, que é o dossiê das VBR.

Nessa matéria, que tipo de testemunho poderia dar à Comissão?

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Doutor.

O Sr. Dr. Luís Amado: – A minha preocupação com esse equipamento foi ter em consideração o pensamento e a posição do Chefe do Estado-Maior do Exército.

Portanto, em relação a todos os equipamentos tive, naturalmente, a preocupação de ouvir os chefes militares e, na medida do possível, também de gerir as suas expetativas em relação à situação que eles próprios tinham de gerir no comando da arma ou no comando de algumas das forças do seu ramo. Portanto, apesar do debate, que se prolongou durante muito tempo ainda, sobre a arma em si, a minha preocupação principal foi justamente garantir a execução do contrato na base do que era a própria consideração que o Chefe do Estado-Maior do Exército fazia.

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Como sabe, estávamos empenhados em forças militares destacadas em vários teatros, a situação das viaturas blindadas era muito preocupante, tivemos mesmo, como se lembram, que operar, na primeira missão no Afeganistão com forças militares portuguesas, com blindados fornecidos por uma força aliada e, portanto, a minha preocupação — lembro-me — em relação à situação da viatura blindada de rodas, que foi adotada no âmbito da decisão do anterior Governo, foi saber qual era a posição do Exército relativamente ao conforto que sentia com a opção assumida pelo anterior Governo, e foi nessa perspetiva que atuámos e tomámos as decisões subsequentes necessárias para implementar essa orientação.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): – O problema com que nos deparamos, nesta matéria, é que, independentemente da opção quanto à capacidade, havia ou houve, historicamente, um problema quanto à operacionalidade e quanto à capacidade de fornecimento do fornecedor escolhido.

Sobre o relacionamento com o fornecedor escolhido, durante esse período de 15 meses, terá alguma memória de como decorreu?

O Sr. Presidente: – Faz favor, Sr. Dr. Luís Amado.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Foi atribulado na exata medida em que o próprio Chefe do Estado-Maior do Exército, à época, transmitia o seu desconforto. Essa impressão registo-a. Nunca tive uma relação direta com o programa e com os principais responsáveis fornecedores, mas houve, de facto, alguma preocupação em relação aos episódios que marcaram a implementação desse programa e a operacionalidade do mesmo.

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O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): – A mesma coisa, portanto, em relação à Marinha, que nunca recebeu os veículos anfíbios e viu descontinuado o programa por resolução recente, presumo eu?

O Sr. Dr. Luís Amado: – Sim. Repare que a preocupação de quem chega — enfim, cada responsável tem a sua própria atitude —, a minha preocupação era justamente manter uma linha de equilíbrio na relação com os responsáveis dos diferentes ramos das Forças Armadas. Como disse há pouco, por exemplo, em relação à Marinha, procurei, na medida do possível, sustentar algumas das opções que estavam assumidas, mas, por exemplo, relativamente ao equipamento escolhido para substituir as fragatas, essa foi, como disse, a única orientação que assumi, pondo em causa opções anteriores. E fi-lo em função também de uma avaliação que fiz da apreciação que a Marinha, no seu conjunto e não apenas pela sua cadeia de comando, à época, fazia dessa opção.

Portanto, foi essa a decisão que tomei, mas naturalmente que a inquietação dos chefes militares relativamente à execução da Lei de Programação Militar é permanente, em toda a parte. Vendo o que se passa hoje, por exemplo, em França, relativamente à execução da Lei de Programação Militar e a grande inquietação dos chefes militares em relação à sua execução, não há nada de novo relativamente ao que são este tipo de procedimentos, mas essa orientação, sem dúvida, tem de ser tida sempre em conta pelo chefe político.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Deputado.

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O Sr. José Magalhães (PS): – Por último, quanto à famosa pergunta inevitável, a que já respondeu, sobre o contacto com o nosso ex-cônsul em Munique, há uma outra questão que não foi colocada e que deve ser colocada.

Na altura, o cônsul, como se apurou mais tarde, já teria faturado 1,6 milhões, tendo sido condenado por corrupção por esse facto. Também sabemos que a tabela da Ferrostaal para luvas era de cerca de 1,6 para todos os intervenientes e assim terá acontecido, em termos que neste momento não nos cabe aclarar mas que estão a ser averiguados por quem de direito, e já sublinhou que se tratava não de uma pessoa maçadora, que deve ser um preconceito do Dr. Portas, mas de uma pessoa afável…

O Sr. Presidente: – Por não ter falado ao microfone, não foi possível transcrever as palavras do orador.

O Sr. José Magalhães (PS): – Ah, certo!

O Sr. Presidente: – Desculpe ter feito um pequeno comentário lateral, não queria interferir na sua intervenção, mas a ideia que tenho não era de uma transmissão de impressão pessoal, teria sido avisado por um chefe de gabinete, na altura, que seria uma pessoa maçadora.

O Sr. José Magalhães (PS): – Tem razão, tem razão! Influente chefe de gabinete, que consegue veicular um adjetivo, um killer, de uma forma bastante eficaz.

A pergunta que lhe fazia é se, em algum momento, lhe foi colocada a questão da discussão do contrato financeiro. Isto porque o contrato

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financeiro foi negociado com um consórcio bancário e nós pedimos o texto integral do documento, que não é um documento fácil de obter…

O Sr. Presidente: – Por não ter falado ao microfone, não foi possível transcrever as palavras do orador.

O Sr. José Magalhães (PS): – Ainda não o vi. Julgo que ainda não chegou, Sr. Presidente.

De qualquer das maneiras, em algum momento chegará. Mas as cláusulas do contrato foram objeto de uma negociação tormentosa e, num determinado momento, terá havido um pedido ao líder da negociação para aumentar o spread, coisa que veio a acontecer.

Nunca lhe foi colocada a possibilidade de reconsiderar a negociação dessas condições financeiras, uma vez que a dívida gerada é uma dívida que se prolonga pelo tempo, e que, aliás, graças à revisão do Eurostat, vai poder ser confortavelmente projetada à razão de 20 milhões por ano, nos próximos anos. Mas o negócio em si, o contrato em si, não foi objeto de nenhuma reavaliação a pedido de ninguém, presumo.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Doutor.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Como sabe, havia muito ruído, já nessa época, em relação ao contrato dos submarinos; havia muito ruído público relativamente ao contrato.

A minha orientação foi considerar o contrato fechado, os detalhes da contratualização estavam fechados e limitei-me, naturalmente, a executá-lo, tendo sempre em consideração que o ruído faria o seu caminho e que, no princípio da separação de poderes, as diferentes entidades responsáveis

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agem em conformidade com as suas competências e com o seu estatuto. Também nunca vi o contrato financeiro. Limitámo-nos a executá-lo em função dos compromissos assumidos em nome do Estado português pelo anterior Governo.

O Sr. Presidente: – Terminou, Sr. Deputado?

O Sr. José Magalhães (PS): – Sim, Sr. Presidente, muito obrigado.

O Sr. Presidente: – Está terminada, então, a inquirição por parte do Partido Socialista.

Segue-se na ronda de perguntas o CDS-PP e, para o efeito, dou a palavra ao Sr. Deputado Lobo D´Ávila.

Faz favor, Sr. Deputado.

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): – Sr. Presidente, começo por cumprimentar o Dr. Luís Amado.

Não faço uma declaração de interesses, como o Sr. Deputado José Magalhães, mas tive oportunidade de acompanhar a atividade do Sr. Doutor enquanto Ministro dos Negócios Estrangeiros e, portanto, no âmbito de uma outra Comissão desta Casa, e, como é evidente, tenho grande consideração por si e não queria deixar de começar por aí.

Sr. Doutor, estamos no âmbito de uma Comissão Parlamentar de Inquérito e eu queria começar por dizer que, de facto, partilhamos os objetivos de consenso no âmbito da política de defesa, que o Dr. Luís Amado aqui referiu, o esforço de consenso e o compromisso alargado que se procurou obter. Portanto, não estamos também propriamente nesta Comissão Parlamentar de Inquérito na procura de qualquer tipo de ajuste de

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contas com o passado ou com qualquer passado, independentemente de que passado for. Entendemos mesmo que esta Comissão pode ter um efeito pedagógico importante, que é, por um lado, perceber a necessidade de o Estado português ter determinado tipo de equipamentos militares — estamos a tratar de sete programas militares distintos — e, por outro lado, perceber também as dificuldades de trabalho de qualquer ministro da defesa nacional, sobretudo em épocas de restrições económicas e orçamentais.

Quanto à primeira questão, de saber se estes equipamentos eram necessários ou não, julgo que todos os chefes e antigos Ministros da Defesa Nacional que já aqui estiveram, todos eles, com maior ou menor grau de entusiasmo, manifestaram a sua posição de que estes equipamentos militares eram necessários — com maior ou menor prioridade, mas eram necessários. E isso também foi confirmado por parte das chefias militares.

Portanto, gostava de começar partindo de um pressuposto, se me é permitido, que é o seguinte: posso concluir, em função daquilo que o Sr. Dr. Luís Amado aqui nos disse, que estes equipamentos eram necessários e aquilo que lhe foi transmitido, na altura, pelas chefias militares foi que, em função até da antiguidade de muitos destes equipamentos, a aquisição destes equipamentos era absolutamente imprescindível. Portanto, posso partir desse pressuposto?

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Doutor.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Sim, foi, aliás, esse o primeiro ponto que aqui abordei, na resposta à pergunta colocada pelo Deputado do Bloco de Esquerda. Não contestei os programas de aquisição, até porque considerava que eles eram necessários e porque os meus chefes militares da época o

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entendiam de igual modo e, portanto, não competia a mim estar a avaliar as decisões do passado, independentemente de poder ter opinião sobre um ou outro dos programas.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Filipe Lobo D´Ávila (CDS-PP): – Pelo menos, já o conseguimos também enquadrar nesse lote de personalidades que aqui vieram depor.

A primeira questão que gostava de colocar – e também com a consideração que tenho – é que, de facto, é fácil, hoje, recuperar afirmações de 2006 em que o Dr. Luís Amado se referia às tais incoerências ao nível do programa das contrapartidas como sendo um embuste. Não só reconheço que é ingrato recuperar essas afirmações para caraterizar a política de contrapartidas antecedente, que, como sabemos, começou em 2000, com enquadramento antes de 2000 — aliás, no caso dos submarinos, há um documento de enquadramento contratual de contrapartidas de 2000, que, seguramente, o Sr. Doutor conhece —, depois tivemos um regime jurídico das contrapartidas em 2006, tivemos muitas experiências diferentes, mas, desde logo, contratos assinados em 2001, nomeadamente dos EH-101, em que havia um contrato de contrapartidas mas não havia uma identificação da lista de contrapartidas. Tivemos, no caso dos submarinos, pré-contrapartidas que foram aceites pela Comissão PRAS em 2000.

Portanto, o Dr. Luís Amado falou-nos aqui numa divergência doutrinária quanto à matéria das contrapartidas, mas aquilo que me parece, com o devido respeito, é que essa incoerência, que retrata o passado, e é um passado que tem datas muito bem identificadas como estas que aqui referi,

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são datas absolutamente incontornáveis em matéria de contrapartidas em Portugal, de 2000 e 2006 pelo menos, mas que também não servem para justificar aquele que foi o baixo nível de execução das contrapartidas, a seguir a si.

Assim, Dr. Luís Amado, posso concluir que a falácia de que nos falava, hoje de manhã, o Prof. Álvaro Santos Pereira relativamente às contrapartidas é o embuste que o Dr. Luís Amado aqui nos refere hoje, ou seja, pouco realismo nos compromissos que são assumidos em matéria de contrapartidas? Inclusivamente, o Dr. Paulo Portas também nos disse aqui que esse problema existiu, desde a sua origem.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Doutor.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Sr. Deputado, não ouvi o que foi dito pelo Prof. Álvaro Santos Pereira e, portanto, não posso estabelecer esse paralelo.

Ora, eu não digo mais do que aquilo que já disse. Acho que, primeiro, essa divergência de duas doutrinas relativamente às contrapartidas existiu desde há muito. Havia, de facto, uma corrente que sempre defendeu que o regime de contrapartidas a negociar, no âmbito de programas de aquisição de novas armas ou de novos equipamentos, devia concentrar-se na modernização dos sistemas de defesa e da indústria militar. Era aí que se devia concentrar. E isso, de alguma forma, justificava uma tutela centrada mais nas Forças Armadas e no Ministério da Defesa. E havia uma corrente, que foi ganhando corpo à medida também das necessidades de desenvolvimento económico do País, e sobretudo também de uma interação muito grande entre muitos setores da indústria e as indústrias de defesa e de equipamento militar, que começaram a justificar uma visão mais aberta do sistema de contrapartidas.

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De facto, sobretudo depois das aquisições feitas pelo Ministro Paulo Portas, no âmbito de uma considerável política de modernização das Forças Armadas que o Governo a que pertencia adotou, o volume de contrapartidas ganhou uma dimensão extraordinária. Estamos a falar de muitas centenas de milhões de euros de contrapartidas. Portanto, esta foi a realidade com que me confrontei objetivamente e é sobre ela que me pronuncio.

O sistema de contrapartidas, com o volume que reunia de recursos mobilizados potencialmente para impactar o processo de desenvolvimento de alguns setores da economia, com as expetativas, aliás, que tinham sido criadas, não era compatível, do meu ponto de vista, com o sistema com a estrutura de gestão e de acompanhamento que, à data, existia. E não era na medida em que a Comissão era uma comissão quase ad hoc, não tinha uma estrutura profissional de acompanhamento, de avaliação da execução, e não tinha qualquer acompanhamento por parte do Ministério da Economia, sendo programas que eram negociados com contrapartidas para setores importantes da indústria nacional.

Portanto, é nesse exercício de avaliação que eu coloco a minha crítica e foi isso que procurei corrigir, na medida do possível. O decreto-lei que foi aprovado foi preparado pelo meu gabinete e foi já aprovado pelo Governo em agosto e a Comissão Permanente de Contrapartidas ficou sediada no Ministério da Economia, junto do gabinete do Ministro da Economia até, o que foi um passo importante no sentido de responsabilizar mais a economia, a indústria, pelo acompanhamento dos programas e da sua implementação, e a estrutura técnica criada era uma estrutura profissional, a tempo inteiro, com técnicos especializados que pudessem acompanhar a implementação dos diferentes programas.

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Foi, portanto, essa a correção estrutural que procurei fazer e é nesse sentido que se devem situar algumas das críticas que fiz, então, e que aqui, hoje, foram referenciadas.

O Sr. Presidente: – Sr. Deputado, por favor, pode prosseguir.

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): – Sr. Doutor, então, isso significa que aquilo que era a divergência doutrinária existente, em bom rigor, não era uma divergência doutrinária com o Governo anterior mas com os diversos Governos anteriores, incluindo alguns do Partido Socialista, que tinham aprovado alguns documentos estruturantes em matéria de contrapartidas. Julgo que essa conclusão parece evidente daquilo que o Sr. Doutor aqui acabou de dizer.

Em todo o caso, indo à Comissão Permanente de Contrapartidas que o Sr. Doutor aqui referiu, gostaria também de dizer o seguinte: o Sr. Doutor, ainda no âmbito da discussão da Lei de Programação Militar em 2006, no debate que teve na Assembleia — porque foi o Sr. Doutor que, enquanto Ministro da Defesa, ainda esteve presente nessa discussão —, dizia que «a nova Comissão Permanente de Contrapartidas, como estrutura permanente dotada de capacidade técnica própria, iria gerir não apenas o processo de negociação dos contratos mas também a sua execução, sendo absolutamente determinante para conseguirmos realizar os objetivos de satisfação das expetativas da indústria portuguesa neste domínio».

O grau de execução dos contratos de contrapartidas, que hoje é possível aferir, em 2006, era de uma execução muito reduzida — no caso dos submarinos, era 30%; no caso dos Pandur, 11% e no caso dos torpedos de 0%. Portanto, posso constatar que não foi bem sucedido nessa intenção, que, provavelmente, seria uma boa intenção.

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O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Doutor.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Não tenho dados para poder responder ou para fazer um juízo sobre o que acabou de dizer, não tenho esses dados. A partir do momento em que cessei funções, não acompanhei mais o que se passava na área da defesa e, portanto, não posso pronunciar-me sobre isso.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): – Mas, então, Sr. Dr. Luís Amado, posso concluir uma outra coisa, que julgo ter percebido de uma intervenção sua: ao fim do primeiro ano de atividade enquanto Ministro da Defesa Nacional, do seu ponto de vista, o contrato dos submarinos estava fechado — o contrato de aquisição, com as cláusulas e os compromissos que tinham sido assumidos — e, portanto, na tal lógica de continuidade que aqui bem nos transmitiu, do ponto de vista das contrapartidas, ao fim do primeiro ano, as contrapartidas (e cito) «não mereciam um esforço considerável por parte do Governo porque estavam a ser bem executadas». Isto, ao fim de um ano, na altura em que o Sr. Doutor deixa as funções.

Portanto, o que é que correu mal e quando é que correu mal? Porque correu alguma coisa mal até 2010.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Doutor.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Não sei exatamente o que é que estava a ser executado e não foi em termos tão absolutos que me pronunciei sobre a bondade da execução do primeiro ano. O que eu digo é que, no conjunto

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das preocupações que tínhamos, à época, o facto de o grau de execução ser considerável — não sei exatamente qual era a taxa de execução que esse programa tinha nos meados de 2006 —, tenho na memória que, no debate que se fazia sobre os diferentes programas, o programa das contrapartidas dos submarinos tinha uma execução considerável e, portanto, não mereceu provavelmente a mesma atenção, até porque também era um programa para oito anos e, portanto, na pressão da gestão do dia a dia e dos muitos problemas que havia nesse dossiê, essa questão era uma questão que tinha tempo para poder ser gerida e, portanto, foi isso que eu procurei transmitir à Comissão.

Agora, não há um juízo de avaliação relativamente à bondade dos projetos incluídos no programa e já executados. Disso não tenho memória nem sei quais eram. Sei que havia, de facto, uma taxa de execução, à época, que não mereceu um alarme e uma emergência em relação a esse programa.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): – Não é tão veemente como eu entendi, que não mereceria um esforço considerável, mas julgo que é bastante clara a afirmação que o Sr. Dr. Luís Amado aqui nos deixa.

Quanto à Comissão Permanente de Contrapartidas, gostaria apenas de lhe perguntar o seguinte: esta Comissão Permanente de Contrapartidas, na altura, já tinha numa tutela partilhada, dupla. Aliás, o espaço físico foi cedido, na altura, à Comissão Permanente de Contrapartidas pelo Ministro da Economia da altura, Manuel Pinho, segundo julgo, e gostava de lhe perguntar — até porque o Sr. Doutor falou na profissionalização da Comissão e isso é um problema que encontrámos, desde o tempo do presidente Torres Campos — em que medida é que foi profissionalizada

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esta Comissão Permanente de Contrapartidas, como afirmou, e se tem ideia de que trabalhava lá alguém a tempo inteiro e se as pessoas que foram indicadas para a Comissão tinham inexperiência em matéria de contrapartidas.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Doutor.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Não tenho de memória registo de quem são as pessoas. A orientação que foi assumida foi esta: o Eng.º Rui Neves foi uma escolha minha, na altura, para dirigir a Comissão Permanente de Contrapartidas, era um gestor bastante experiente, com uma larga experiência de gestão também no setor público, e sei que havia a responsabilidade do Ministério da Economia acompanhar o trabalho da comissão de contrapartidas com a dotação dos recursos técnicos necessários em cada circunstância para os atos de gestão corrente na comissão.

O Eng.º Rui Neves aí estará, dentro de pouco tempo, parecendo mesmo que foi uma coisa bem premeditada, e ele, seguramente, informá-lo-á, com memória viva, sobre quantos funcionários, quem trabalhava, a que tempo.

Mas essa foi a orientação, que está, aliás, plasmada no decreto-lei, que foi aprovado e que estabelece uma nova doutrina para a Comissão de Contrapartidas.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): – Sr. Doutor, quanto aos Pandur, o incumprimento de entrega das viaturas ocorreu logo em 2006,

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não sei se na sua altura ou se no tempo do Ministro da Defesa Nacional que lhe sucedeu.

Gostava de lhe perguntar isso, e, mais, sendo certo que o primeiro incumprimento se dá em 2006, com a não entrega de 11 viaturas, o que é justifica que a primeira interpelação admonitória remetida pelo Governo só seja feita em Maio de 2010? Também gostava de lhe perguntar se tem isso presente por que é que isso aconteceu.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Doutor.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Não lhe posso responder. Limito-me ao período em que estive em funções e não posso estar…

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): – Por não ter falado ao microfone, não foi possível transcrever as palavras do orador.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Não, mas compreenderá que não posso estar a fazer uma avaliação… Até porque só agora é que estou a ouvir isso pela primeira vez, isto é, não sabia que só em 2010 é que isso tinha sucedido.

Portanto, limito-me a pronunciar-me sobre o período que, neste caso, felizmente, até foi curto, porque, se fosse mais longo, provavelmente, o Sr. Deputado teria muito mais matéria para poder atingir-me. Assim, tem de repartir o esforço por vários protagonistas do setor.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Deputado.

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O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): – Sr. Dr. Luís Amado, não pretendo atingi-lo com nenhuma pergunta mais incómoda, mas queria terminar falando do programa do C-295, que, como sabemos, foi um contrato que entrou em vigor em fevereiro de 2006, por um período de vigência de sete anos, e que, em 2011, tinha uma execução de 13%.

Já percebei que o Sr. Doutor não vai poder explicar porquê, teremos de tentar saber isso junto dos presidentes da Comissão de Contrapartidas, mas queria terminar fazendo-lhe uma pergunta que tem a ver com decisões pessoais, concretas, que o Sr. Doutor assumiu, e, diria eu, bem — quero dizer-lhe que acho que decidiu bem —, mas o Sr. Ministro da Defesa Nacional Augusto Santos Silva veio dizer que lesaram — não essas suas decisões mas relativamente a outras iguais — o interesse público.

Refiro-me, concretamente, à opção que foi tomada neste contrato do C-295 de remeter, por um lado, a resolução de qualquer litigio relacionado com o contrato para arbitragem sem recurso para os tribunais, o que é algo que tem baralhado muito o Partido Socialista e, inclusivamente, o Ministro Augusto Santos Silva veio dizer que, na altura, tinha ficado diminuído nos seus instrumentos contratuais que tinha ao seu dispor para zelar pelo interesse público, quando, olhando para este contrato, Dr. Luís Amado, temos exatamente o mesmo instrumento.

Pergunto-lhe: do seu ponto de vista, objetivamente e olhando apenas para aquela que foi a sua responsabilidade e para a sua atuação, o Sr. Doutor considera que o interesse público ficou salvaguardado no contrato que assinou quando previu este instrumento concreto de recurso à arbitragem sem recurso?

Provavelmente o Sr. Doutor não tem obrigação de saber mas, como é evidente, pergunto-lhe ainda se a arbitragem também não é um meio habitual neste tipo de contratos, de tal maneira habitual que o Sr. Doutor o

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consagrou num contrato do seu tempo. A pergunta é apenas sobre esse contrato do seu tempo e não sobre outros. As considerações que aqui fiz foi aquilo que nos vieram transmitir, aqui, ao Parlamento.

Para terminar, se o Sr. Presidente me permite, quanto ao regime jurídico das contrapartidas, perguntava-lhe também, quanto à garantia que foi prevista neste contrato, dizendo-lhe, uma vez mais, que considero que o Sr. Doutor atuou bem porque previu uma garantia neste contrato, que é de 25%, coisa que tinha acontecido quer no contrato dos Pandur e acontece também, agora, neste contrato do C-295 e que não tinha acontecido no contrato dos submarinos, exatamente porque essa garantia de 10% vinha do tempo do documento de enquadramento contratual das contrapartidas de 2000.

Por isso, gostava de lhe perguntar, se assim é, por que razão é que o Sr. Doutor aceitou incluir 25% de garantia — terá feito o melhor possível e conseguiu consagrá-la no contrato do C-295 —, mas no regime jurídico das contrapartidas já se previu apenas 15% como garantia exigida neste tipo de contratos.

Era só isto e muito obrigado pelos esclarecimentos.

O Sr. Presidente: – Para uma última resposta ao Deputado Lobo d’Ávila, tem a palavra, Sr. Doutor.

O Sr. Dr. Luís Amado: – É uma pergunta diferida que tem um alvo diferente e, portanto, não lhe poderei dizer muito mais do que o que vou dizer.

O contrato, que foi o único, aliás, da minha responsabilidade, foi um contrato que, creio, até hoje, não gerou qualquer controvérsia. Foram, aliás, cinco contratos assinados no mesmo dia, na presença de três ministros, e,

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portanto, creio que salvaguardando o interesse público. Mas não estou eximido de ter cometido algum erro, não sei. Como sabe, não vamos ler os contratos, mas eu parto sempre do princípio de que quem está em funções governativas, por norma, está orientado por um princípio de boa-fé e de interesse público. É assim que eu avalio, o que não quer dizer que não cometamos erros e não quero dizer que não haja, de quando em vez, casos de atuações à revelia deste princípio, mas, por norma, é esse princípio que deve prevalecer no juízo, até prova em contrário, e é esse o princípio que deve ser adotado.

Em relação a esses contrato concreto, não faço ideia de quais os parâmetros da negociação contratual que foram determinados no jogo de negociação entre fornecedor e Estado português, mas creio que a equipa que o fez era uma equipa muito responsável, uma equipa de profissionais, que fez seguramente o seu melhor e creio que, até hoje, esse contrato não foi objeto de nenhuma controvérsia.

O Sr. Presidente: – Passamos, a seguir, ao Partido Comunista Português. Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe, também para usar os seus 10 minutos.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Filipe (PCP): – Sr. Presidente, Sr. Dr. Luís Amado, os meus cumprimentos.

Já foram feitas muitas perguntas mas, ainda assim, há umas questões que, creio, poderia precisar. E começaria talvez pela aquisição dos aviões C-295, que, como referiu, foi assinada por si.

O Sr. Doutor manteve uma linha de continuidade solidária relativamente ao seu antecessor, aliás, assumida, e lembro-me dos debates

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que tivemos, na altura, na Comissão de Defesa Nacional sobre essa matéria, em que o Sr. Doutor assumiu a opção de não pôr em causa nenhuma das decisões tomadas pelo seu antecessor, designadamente nesta matéria de que estamos a falar, de aquisição de equipamentos militares, por entender que, na área da Defesa Nacional, deveria haver uma continuidade, uma estabilidade muito grande de políticas de governo para governo.

Porém, relativamente à aquisição dos aviões C-295, creio que não foi absolutamente pacífico o número de aviões adquiridos, de 12. Na altura, já era questionada a necessidade de 12 aeronaves dessa natureza, se não seria preferível uma aquisição mais modesta, até porque, creio, está hoje demonstrado que uma parte dessa esquadra não está operacional, dadas as limitações financeiras que existem relativamente à esquadra.

Portanto, a primeira questão que lhe coloco é se não se questionou sobre a bondade da aquisição de 12 aeronaves C-295.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Sim, respondendo diretamente, questionei-me. Naturalmente que, como disse há pouco, esse exercício de avaliação foi sempre feito tendo em conta uma direta conversação e diálogo com o Chefe do Estado-Maior da Força Aérea e com o Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas. Portanto, se esse número prevaleceu teve, seguramente, em consideração as opções que decorrem de uma avaliação feita pelos responsáveis militares, em função das necessidades do País, da sua natureza arquipelágica e em função também de uma opção à época que ponderei e esteve também presente no meu juízo relativamente ao Golfo da Guiné e à importância que tinha a presença de um aviocar nesse teatro.

Infelizmente, essa opção, depois, mais tarde, também por razões financeiras da Força Aérea, teve de ser abandonada, mas eu considerei que a possibilidade de ter estacionado, fora do território nacional e para além

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das bases aéreas nacionais, um meio aéreo no território do Golfo da Guiné justificava, do meu ponto de vista, que se tivesse em consideração na avaliação do número de aeronaves a substituir.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): – Sr. Doutor, quando assumiu funções, relativamente aos equipamentos militares que haviam sido adquiridos, havia uma bomba-relógio que era a manutenção dos EH-101, em que, quando terminasse o período de garantia, o País ficava com o problema de não ter sido assegurada a manutenção. E essa bomba-relógio rebentou, creio, já quando estava em funções o seu sucessor, o Prof. Nuno Severiano Teixeira.

A questão que lhe coloco é se tinha conhecimento desse problema e se foram tomadas algumas medidas ou pensadas soluções para o resolver quando ele ocorresse.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Doutor.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Não sei se estava na sala, mas eu, há pouco, respondendo a uma questão do Deputado José Magalhães, sublinhei a atenção grande que foi dada, durante o período que estive no Ministério da Defesa, ao problema do contrato de manutenção dos submarinos.

É certo que tínhamos o período de garantia, que, de alguma forma, nos protegeu durante algum tempo, e, por isso mesmo, dedicámos grande trabalho à preparação do contrato de manutenção. Não foi uma negociação fácil nem pacífica, na relação, em particular, com o comando da Força Aérea, à época, mas foi possível, apesar de tudo, garantir um conjunto de

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opções, cuja continuidade, aliás, creio que foi assegurada pelos representantes que me sucederam.

Mas esse era um problema dos problemas mais delicados com que nos confrontámos, em matéria de manutenção dos equipamentos em causa.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Filipe (PCP): – Considera que, aquando da assinatura do contrato de aquisição, os interesses do Estado foram mal defendidos ao não ter sido assegurado? Já aqui foi dito «bem, não havia problema porque havia uma garantia e, enfim, enquanto houvesse garantia não havia problema e depois logo se veria». Acha que é razoável esse tipo de atitude? Não acha que se deveria ter salvaguardado, no momento da aquisição, o futuro, porque não era assim um futuro tão distante como isso?

O Sr. Presidente: – Faça favor, Sr. Doutor.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Naturalmente, não faço juízos sobre decisões que foram tomadas por meus antecessores, mas cada caso é um caso e as circunstâncias variam. Eu, por acaso, pude fechar a negociação do contrato dos C-295 em simultâneo com vários contratos, mas, como sabe, muitas vezes, as circunstâncias de negociação, e também a pressão negocial orientada num sentido ou noutro, justificam certas opções. E o facto de aí haver um período prolongado entre o contrato de aquisição, o fornecimento do equipamento e o período de garantia do equipamento, do meu ponto de vista, pode dar justificação fácil para uma opção como aquela que foi adotada.

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Mas, Sr. Deputado, como lhe digo, acho que nenhum responsável em funções atua à margem de um princípio de boa-fé e de salvaguarda do interesse público, o que não quer dizer que não haja, por vezes, erros que são cometidos e não quer dizer também que não haja apreciações subjetivas críticas relativamente às opções que foram tomadas, mas esse é o princípio pelo qual eu regulo a leitura que faço da ação política e, em particular, da ação governativa.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Filipe (PCP): – Sr. Doutor, relativamente à Comissão Permanente de Contrapartidas, o Sr. Doutor, quando exerceu funções, substituiu o Dr. Pedro Brandão Rodrigues pelo Eng.º Rui Neves e eu pergunto-lhe se essa substituição significou um mero «render da guarda» de pessoal político – o Dr. Pedro Brandão Rodrigues tinha siso nomeado pelo seu antecessor – ou se, pelo contrário, essa substituição foi feita na base de uma avaliação negativa da prestação que a Comissão Permanente de Contrapartidas tinha tido até então.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Doutor.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Já respondi implicitamente a essa questão. Aliás, é curioso que diga que eu segui o programa do meu antecessor mas que, depois, substituí uma pessoa que seria, no seu entender, da confiança política do meu antecessor. É assim que as coisas se devem fazer, do meu ponto de vista: a política manteve-se, não pus em causa contratos que envolveram muito trabalho e muito esforço de negociação, que tinham um timing que, se diferido por qualquer manobra dilatória, não deixaria de ter

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reflexos na capacidade operacional das Forças Armadas. Relativamente a algumas das opções de equipamento, isso era claro, porque alguns dos materiais e equipamentos estavam já na fase obsoleta da operacionalidade e, portanto, achei que, do ponto de vista do interesse público, esse princípio de estabilidade nas decisões públicas é fundamental para salvaguarda dos interesses do Estado e, assim, esse princípio, adotei-o.

Agora, a crítica que fiz na avaliação, que já fazia enquanto Deputado, do regime de contrapartidas tal como ele funcionava, a crítica que fazia à desproporção entre as funções que essa comissão tinha e a massa de recursos que, entretanto, os últimos contratos lhe garantiam para serem geridos na linha do interesse público, justificavam outras opções. Portanto, naturalmente, optei por recrutar uma pessoa da minha confiança. Não tinha nenhum juízo de valor sobre a ação do anterior membro da Comissão Permanente de Contrapartidas, não era uma questão pessoal, era uma questão política.

Não tinha nenhuma opção política diferente, com a exceção que enunciei em relação ao programa de aquisição de equipamentos. A única exceção foi relativamente às fragatas Perry. Tinha as minhas dúvidas antes, confirmei-as depois e tomei uma decisão contrária ao que era a decisão do meu antecessor, mas relativamente ao funcionamento do regime de contrapartidas, tinha uma visão política diferente e, portanto, precisava também de mudar os atores. Foi nessa circunstância que optei por substituir o presidente da Comissão de Contrapartidas, colocando uma pessoa da nossa responsabilidade e uma pessoa que acertou comigo, na altura, as suas próprias opções relativamente à Comissão Permanente de Contrapartidas.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Deputado.

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O Sr. António Filipe (PCP): – Sr. Doutor, quando o Eng.º Rui Neves assumiu funções foi ouvido na Comissão de Defesa e, tanto quanto me recordo, na altura, deu-nos conta da necessidade que teve de quase montar uma estrutura, que era quase inexistente, apesar de, aqui, o Dr. Pedro Brandão Rodrigues, na altura, enquanto responsável da Comissão de Contrapartidas, ter afirmado que as contrapartidas correspondiam quase a um quadro comunitário de apoio pelo montante de verbas que envolviam. Mas, depois, o Eng.º Rui Neves veio confrontar-nos mais com a realidade e dizer que, de facto, isto praticamente não tinha funcionado.

Sucede que, quando o Dr. Pedro Catarino foi chamado a substituir o Eng.º Rui Neves, o juízo também não era muito favorável ao que tinha sido feito nesse período, inclusivamente dava-nos conta de que vários Ministérios que deveriam nomear os seus representantes da Comissão Permanente de Contrapartidas nem sequer o faziam, designadamente o Ministério da Ciência nunca indicou o seu representante.

Portanto, pergunto-lhe se teve noção das dificuldades de funcionamento da Comissão Permanente de Contrapartidas e designadamente desse facto, isto é, de nem todos os Ministérios darem a colaboração que era suposto darem.

Pergunto-lhe se foi alertado para essa situação e se tomou alguma atitude relativamente a ela.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Filipe (PCP): – Não, não fui alertado, mas nós já andamos aqui todos (o Sr. Deputado também) há muitos anos e sabemos como funciona o Estado, a Administração Pública, e sobretudo a dificuldade muito grande que há em interagir ou fazer interagir diferentes

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Ministérios. Nunca tive dúvidas de que haveria dificuldade. Foi difícil até concertar posições no Governo relativamente à necessidade da dupla tutela, por exemplo, e, portanto, isso é um problema da nossa Administração. Temos muita dificuldade em colocar serviços, que vivem, mais ou menos, em funções isoladas, na prática corrente da Administração, em interação com serviços de outros Ministérios. Creio que é um problema que decorre da cultura da Administração Pública portuguesa, em grande parte, e, portanto, naturalmente que não me espanta que esse juízo tenha sido feito em relação à disfunção de alguns dos setores envolvidos na Comissão de Contrapartidas.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Filipe (PCP): – Sr. Doutor, um dos aspetos que foi referido pelo Embaixador Pedro Catarino era a dependência crónica – essas foram as palavras que ele usou na altura – da Comissão de Contrapartidas relativamente a um escritório de advogados, que sabemos que é o do Dr. Sérvulo Correia. Aliás, a Comissão de Contrapartidas, depois, deixou de recorrer aos serviços desse escritório e passou a utilizar diretamente o departamento de assuntos jurídicos do Ministério da Defesa Nacional.

Pergunto-lhe se tinha noção dessa dependência crónica, que, ao que parece, correspondia a um encargo financeiro muito pesado para a Comissão Permanente de Contrapartidas.

O Sr. Presidente: – Sr. Doutor, faça favor.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Sei que havia uma ligação muito intensa entre esse escritório e o Ministério da Defesa e a Comissão de

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Contrapartidas, no âmbito da preparação dos contratos de aquisição. Essa era uma realidade, mas isso não punha em causa, de forma alguma, a competência e os critérios adotados na contratação dos serviços desse escritório de advogados. Era um escritório que dava todas as provas de credibilidade e competência relativamente ao fim que estava em causa e, portanto, também aí um princípio de continuidade me pareceu importante salvaguardar.

Creio que quando se muda de interlocutores por razões que tenham apenas que ver com critérios de interesse pessoal ou de interesse até político — e, nestes domínios, como sabe, esses critérios pesam —, normalmente é o interesse público que fica lesado. É preciso começar tudo de novo, é preciso fazer novos contratos, os novos protagonistas, muitas vezes, têm dificuldades em entrar nos meandros de negociações muito complexas e, portanto, adotei esse princípio de manter uma linha de continuidade relativamente aos principais protagonistas do processo de negociação complexo, pesado, longo e difícil que foi o de alguns dos sistemas de armas e de equipamentos em causa. Admito que, também do ponto de vista das contrapartidas, esse impacto tenha existido e tenha justificado, eventualmente, uma avaliação mais pertinente de um sucessor, mas a minha posição foi essa, não a nego nem me penalizo por ela.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Filipe (PCP): – Quando o Sr. Doutor assumiu funções estavam já em curso os programas de contrapartidas do EH-101, que tinha sido assinado em 2001; o dos submarinos, em 2004; o dos Pantur, em fevereiro de 2005; o dos torpedos, em março de 2005, e, depois, já no seu

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tempo, foram assinados os contratos relativamente à modernização dos F16 e à aquisição dos aviões C-295.

Ora, praticamente em todos estes contratos, quer nas aquisições quer nas contrapartidas, creio, há duas entidades que surgem praticamente em todos, que é a ESCOM e o escritório do Dr. Sérvulo Correia.

Pergunto se nunca se questionou sobre a dependência, porventura excessiva, do Ministério da Defesa Nacional, do Estado português neste caso, em assuntos financeiramente tão relevantes, de um número tão restrito de entidades.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra Sr. Doutor.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Questionei, como disse, e não achei que fosse um bom princípio, mas, como lhe disse, ponderando o impacto que outras opções podiam desenvolver, mantive essas orientações.

Como digo, é sempre bom diversificar, do meu ponto de vista, a contratualização de serviços nos diferentes Ministérios, embora, neste caso específico, também se tenha desenvolvido ali uma competência, ao longo dos anos, que, de alguma forma, ponderava na avaliação que os diferentes responsáveis pela pasta da Defesa viriam a fazer da prestação desses serviços. Creio que essa linha de continuidade se manteve-se, não fui eu apenas a manter a continuidade dos serviços dessas entidades.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Filipe (PCP): – Sr. Presidente, nesta primeira ronda, ficaria por aqui e, depois, avaliarei se haverá necessidade de perguntas adicionais.

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O Sr. Presidente: – Com a intervenção do PCP, terminámos a primeira ronda.

Existe, agora, uma segunda ronda, de 5 minutos a cada grupo parlamentar, com pergunta corrida e resposta também corrida, portanto, sem interrupções.

Pergunto ao Bloco de Esquerda, ao Sr. Deputado João Semedo, se pretende usar desta segunda ronda.

O Sr. João Semedo (BE): – Não, Sr. Presidente, não quero fazer mais qualquer pergunta ao Sr. Dr. Luís Amado, queria apenas fazer um comentário a uma afirmação do Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila que não corresponde à realidade, pelo menos na minha forma de interpretar o que tenho ouvido nesta Comissão.

O Dr. Luís Amado, em tempos, caraterizou os programas de contrapartidas como um embuste, hoje, o Dr. Álvaro Santo Pereira caraterizou-as como uma falácia, não foi nem uma coisa nem outra que foi aqui afirmada pelo Dr. Paulo Portas. O que o Dr. Paulo Portas disse é muito diferente de considerar que as contrapartidas são falácias ou embustes. Aliás, era difícil fazê-lo porque, só à conta dos submarinos, em contrapartidas foram 1,2 mil milhões de euros e, portanto, era difícil que, quem subscreve contrapartidas neste valor, venha aqui, depois, dizer, apesar de terem passado entretanto muitos anos, que são embustes ou falácias.

O que o Dr. Paulo Portas disse foi diferente, disse que «não se podia desenvolver, criar, qualquer ilusão sobre as contrapartidas, que elas constituiriam, digamos, um lucro e uma vantagem sobre o valor dos

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programas militares e que, portanto, os programas militares custavam o que custavam, independentemente das contrapartidas».

Isto é muito diferente de dizer que elas são embustes ou falácias e eu não queria deixar passar essa imprecisão.

O Sr. Filipe Lobo D´Ávila (CDS-PP): – Permite-me que use da palavra, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: – Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila, queria dizer-lhe que não temos interpelações nem debate direto entre os grupos parlamentares, neste momento. Estamos na segunda ronda e vamos respeitá-la.

Sr. Deputado Lobo d’Ávila, se estivesse de acordo, quando chegasse a sua vez, não deixaria também de o consultar.

Portanto, pergunto ao Sr. Dr. Luís Amado se quer fazer algum comentário e, no caso de não querer, sigo a ordem dos partidos e pergunto ao PSD…

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): – Por não ter falado ao microfone, não foi possível transcrever as palavras do orador.

O Sr. Presidente: – Diga?

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): – Sr. Presidente, queria fazer uma interpelação à mesa.

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O Sr. Presidente: – O Sr. Deputado João Semedo não usou essa figura. Se tivesse usado… Obviamente, o Sr. Deputado pode fazê-lo, se quiser.

De manhã, foi diferente, porque houve uma interpelação, já no final da última pergunta ao Dr. Santos Pereira, e eu abri uma ronda de interpelações. Aqui, estamos em plena segunda ronda de perguntas ao Dr. Luís Amado. Portanto, o que pode acontecer, Sr. Deputado, se adotarmos esta prática, é que qualquer ronda de perguntas pode, no futuro, ficar prejudicada por interpelações dos partidos.

Sr. Dr. Luís Amado, deseja fazer algum comentário.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Não, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente. – Portanto, passo ao partido seguinte, que é o Partido Social-Democrata, e dou a palavra ao Sr. Deputado Paulo Simões Ribeiro.

O Sr. Paulo Simões Ribeiro (PSD): – Sr. Presidente, desejava cumprimentar os Srs. Deputados e o Sr. Dr. Luís Amado.

Não vou precisar muito as perguntas que lhe queria colocar porque o Sr. Doutor já fez questão de nos dizer que, muito do que é a filigrana da negociação das contrapartidas e o seu acompanhamento, terá de ser endereçado ao Eng.º Rui Neves e, portanto, assim o faremos. Queria só colocar-lhe duas questões mais de índole geral, em termos de política do Ministério.

A primeira é no sentido de saber, enquanto o senhor foi Ministro, naturalmente, qual o grau de autonomia que a Comissão Permanente de Contrapartidas tinha no acompanhamento e, principalmente, na

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renegociação das várias contrapartidas que estavam em execução durante esse período.

A última questão, esta mais concreta, é a seguinte: no relatório da Comissão Permanente de Contrapartidas de 2006, vem referido que o Ministério da Defesa Nacional, em abril de 2006, solicitou àquela Comissão um apoio para a solução do problema da manutenção dos helicópteros EH-101. Portanto, se pudesse, gostaria que nos dissesse quais os problemas que identificou relativamente à manutenção do helicóptero EH-101.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra o Sr. Dr. Luís Amado, para responder, por favor.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Em relação à autonomia, ela era muito grande relativamente às competências, que vieram, aliás, a ser consagradas pelo decreto-lei que estabelecia o seu novo regime de funcionamento.

Havia um processo de acompanhamento permanente, dado o melindre e a importância política do tema para o conjunto da política de defesa, mas, naturalmente, a Comissão de Contrapartidas, no âmbito do reforço de competências que lhe foi conferido, tinha uma responsabilidade grande relativamente ao acompanhamento dos programas, à sua renegociação, informando, naturalmente, o Ministro da Defesa, de acordo com os critérios que eram pré-estabelecidos.

Em relação ao EH-101, como lhe digo, a circunstância de se aproximar a fase operacional desse equipamento – equipamento de grande custo mas também de grande modernidade e complexidade tecnológica, dotando, aliás, a Força Aérea de um dos equipamentos mais apetecíveis por forças aéreas de países aliados –, a sua entrada em operações, naturalmente,

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acelerou a inquietação relativamente à negociação do contrato de manutenção.

Não tenho bem preciso, mas tenho ideia de que o equipamento EH-1001 – o Deputado António Filipe é capaz de ter isso mais preciso do que eu – entrou em funcionamento durante o meu mandato. Tenho ideia de que foi mesmo no início de 2006 que começou a entrar em operações e, portanto, atendendo ao período de garantia, havia uma margem para poder negociar, mas havia o problema de que não tínhamos um contrato de manutenção em condições que salvaguardasse alguns interesses do Estado português em relação ao fornecedor desse equipamento.

Sobre os aspetos dessa renegociação, que não tenho presentes, o envolvimento da Força Aérea foi muito importante e foi necessário e a pressão em relação ao fornecedor não foi fácil de gerir. Portanto, os problemas a que faço alusão, seguramente, têm a ver com essa situação e com essa circunstância de dependência do fornecedor, tendo o equipamento já a operar e não tendo salvaguardada ainda uma posição definitiva em relação à manutenção no futuro, embora estivessem em vigor as condições garantidas pela garantia.

O Sr. Presidente: – Pelo Partido Socialista, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): – Sr. Presidente, eu só regressava à questão da orientação geral da postura do Estado, do Governo em concreto, em matéria de contrapartidas para eliminar qualquer dúvida sobre uma fonte de que falou o Sr. Dr. Luís Amado, há pouco, quando aludiu à revisão da orientação e à inovação no enquadramento legal e nas regras do jogo, por assim dizer, em matéria de contrapartidas.

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A Assembleia tem e teve, ao longo dos anos, uma postura bastante ativa nesta matéria e, portanto, não descobrimos a pólvora nem estamos a fazer alguma coisa que não tenha sido território percorrido anteriormente, designadamente por comissão parlamentares, designadamente a Comissão de Defesa. Mas julgo que terá pesado na decisão de alterar as regras do jogo o estudo do ISEG – de facto, é do ISEG, tive ocasião de confirmar —, elaborado por peritos, que fez uma espécie de análise retrospetiva das contrapartidas fornecidas e, ulteriormente, um relatório parlamentar, que publicou em anexo esse outro relatório, concluiu que «nos quatro programas de contrapartidas referidos e analisados, predominavam os projetos que envolviam vendas e exportações, com um peso de 75% do total, em detrimento de projetos de transferência de tecnologia, e considerou que tinham tido expressão muito significativa projetos pouco inovadores, de baixa intensidade tecnológica, com fraco potencial de crescimento e com fraca capacidade de estimular a mutação do padrão de especialização da economia portuguesa».

A seguir, fundamentava a desigualdade dos beneficiários, distinguindo entre aqueles que tinham uma postura proativa e uma organização de bom aproveitamento para se reposicionarem nas cadeias de valor e os outros, designadamente pequenas e médias empresas, que se revelavam incapazes de se encaixarem nas que podiam potenciar vantagens, em concreto.

Portanto, julgo que este estudo pesou bastante na alteração, na viragem de orientação que impulsionou e que já não pode concretizar, uma vez que tinha cessado funções na altura em que o diploma foi publicado e entrou em vigor.

Concluo, portanto, corretamente que assim foi? Foi este instrumento um dos que mais pesaram na viragem?

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O Sr. Presidente: – Tem a palavra, Sr. Doutor, para responder.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Sim, sem dúvida, esse estudo foi a primeira das decisões que tomámos no âmbito da comissão de fiscalização. Foi uma sugestão do Eng.º Rui Neves. Creio que era o Prof. Vítor Santos que coordenava a equipa do ISEG que fez esse estudo, portanto, alguém que conhecia bem a estrutura da economia e, em particular, da indústria portuguesa, que viria a ser, aliás, secretário de Estado mais tarde. A nossa orientação de fundo em relação às opções que constam do decreto-lei e as orientações propostas decorrem dessa avaliação.

Agora, esse estudo já é o resultado de uma opção política de fundo que tive oportunidade de transmitir: a avaliação de que havia uma desproporção e um desequilíbrio no sistema de gestão de contrapartidas face aos objetivos dos programas e face ao considerável volume de recursos que já integravam esse conjunto de programas e cujo impacto, aliás, podia ser refletido numa ação política que tivesse verdadeiramente consequências em alguns dos setores da atividade económica.

Portanto, essa era uma orientação de fundo que nos levou a pressionar muito, no seio do Governo, a abertura do Ministério da Economia para a aceitação de uma tutela partilhada relativamente à gestão destes programas. Foi essa, sem dúvida, a orientação de fundo.

Não me recordo exatamente dos termos do estudo, mas, na altura que o li, surpreendeu-me muito a avaliação que foi feita por esses critérios relativamente ao impacto, em concreto, que tinha na economia e no tecido industrial português, o que refletia justamente a situação de desequilíbrio que havia no sistema.

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O Sr. Presidente: – Segue-se o CDS-PP e dou a palavra ao Sr. Deputado Lobo D´Ávila para responder ao Sr. Deputado João Semedo e perguntar ao Dr. Luís Amado, presumo eu.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): – Sr. Presidente, quanto à interpretação sobre aquilo que os antigos Ministros da Defesa cá veem dizer, cada um terá aquela que bem entender, como é evidente, e teremos todos, seguramente, opiniões diferentes sobre aquilo que, objetivamente, é dito por cada um dos depoentes.

Aquilo que eu aqui disse, para que fique claro, numa pergunta que dirigi ao Sr. Dr. Luís Amado, era se a falácia, de que nos falava hoje o Prof. Álvaro Santos Pereira, correspondia ao embuste de 2006, que o Dr. Luís Amado referiu. E concretizei, dizendo mesmo que se isso era algo de pouco realismo naquilo que tinham sido os compromissos assumidos em determinado momento pelo Estado português, se isso correspondia às dificuldades do modelo que aqui foram referidas.

Como é evidente, do nosso ponto de vista, o que está aqui em causa são as dificuldades no modelo de contrapartidas e isso será, seguramente, verificável pela transcrição das declarações que o Dr. Paulo Portas aqui fez, em que essas dificuldades estão bem identificadas. Como é evidente, na nossa opinião, estamos a falar da mesma coisa, estamos a falar dessas dificuldades de modelo e é isso que está em causa.

Portanto, a interpretação que o Bloco de Esquerda faz sobre aquilo que é referido é com o Bloco de Esquerda, não pretendo imiscuir-me nessas interpretações — nem nas do Bloco de Esquerda, nem nas do PS, nem nas de outros partidos.

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Aquilo que, para nós, conta é isto e queria que ficasse claro, embora, Sr. Presidente, tal como foi feito hoje de manhã um pedido das transcrições, no caso concreto, sobre as dificuldades, sugeria que a Mesa também pudesse disponibilizar a todos os Deputados aquilo que foi referido pelo Dr. Paulo Portas quanto às dificuldades na origem das contrapartidas, que julgo que também demonstra muito daquilo que são as dificuldades do modelo que o Dr. Luís Amado aqui nos referiu.

Portanto, quanto a isso, Dr. João Semedo, não há qualquer problema da nossa parte, a não ser a divergência natural de interpretação quanto aos acontecimentos e quanto aos depoimentos.

Para terminar, Sr. Presidente, agradecendo as declarações e o depoimento do Dr. Luís Amado, queria colocar duas perguntas finais.

Voltando ao tema da arbitragem, Sr. Dr. Luís Amado, faço a pergunta ao contrário daquela que fiz há bocado, ou seja, do seu ponto de vista, do ponto de vista de quem procurou de boa-fé salvaguardar o interesse público — como não tenho a mínima dúvida que aconteceu, e quero dizê-lo de forma clara —, o Sr. Doutor, de boa-fé e do ponto de vista da salvaguarda do interesse público, aceitou introduzir uma cláusula de arbitragem sem recurso, achando que estava a salvaguardar o interesse público. A pergunta é: sim ou não, se possível. E gostava que me respondesse.

Por fim, só para atenuar os espíritos mais exaltados, queria dizer que, de facto, cometi aqui uma incorreção ao referir que a cláusula penal de 25% tinha sido estabelecida pelo Dr. Luís Amado, quando, de facto, assim não foi, porquanto ela veio ainda do Governo anterior. O Sr. Doutor o que fez foi participar no processo de aprovação do regime jurídico de contrapartidas, que consagrou uma cláusula de incumprimento de 15% ao nível das garantias. Portanto, era apenas esta divergência, de facto, é uma

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incorreção minha, mas queria dizer-lhe também que demonstra uma opção que foi tomada na altura e é a que é.

Eram estas as duas afirmações e a pergunta final, se possível, é de sim ou não.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra o Sr. Dr. Luís Amado, para, na parte que lhe diz respeito, para responder.

O Sr. Dr. Luís Amado: – Sim, mas, em função das circunstâncias, cada caso é um caso, cada contrato é um contrato. Não sou jurista, um ministro que seja jurista colocará uma atenção diferente nas opções contratuais que lhe são apresentadas, mas não acredito que seja o ministro a negociar as condições contratuais; essas condições são negociadas na base de uma equipa de negociação e na base de especialistas reputados que têm essa função e essa responsabilidade.

Portanto, não posso deixar de lhe dizer que cada negociação tem a sua circunstância, tem os seus atores, mas parto do princípio de que as opções que são assumidas no fim têm sempre na origem um princípio de salvaguarda do interesse público. Não quer dizer que não haja exceções e não quero dizer que não haja, por vezes, erros. Mas, nestes casos, é esse o juízo que eu faço.

O Sr. Presidente: – Nesta segunda ronda, o último partido, o PCP, não tem nada a perguntar.

Pergunto se alguém se inscreve para uma terceira ronda.

Pausa.

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O Sr. Presidente: – Tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.

O Sr. João Semedo (BE): – Sr. Presidente, lamento, mas tem que ser. Esta Comissão vai inquirindo, vai ouvindo e há quem já tenha tirado conclusões antes da fase das conclusões e eu queria contestar isso.

Acho que é abusivo o que o Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila pretendeu fazer, que foi pôr em linha a caraterização feita pelo Dr. Luís Amado com a caraterização feita pelo Dr. Álvaro Santos Pereira e a caraterização feita, há tempos, pelo Dr. Paulo Portas. Acho uma interpretação abusiva e queria sublinhá-lo.

E sublinho-o por uma razão simples: é que já se percebeu que a estratégia do CDS é muito clara. Todas as pessoas que aqui são ouvidas, de alguma forma, naquilo que dizem, têm de ser o eco do que disse o Dr. Paulo Portas ou do que fez o Dr. Paulo Portas. E isso tem que ser discutido.

Não quero deixar passar isso em claro para que não se cristalize essa ideia de que houve o antes e o depois do Dr. Paulo Portas. O que é bom no processo de aquisição de equipamento militar e das contrapartidas é do Dr. Paulo Portas ou é à Dr. Paulo Portas; tudo o que correu mal foi porque estava mal antes do Dr. Paulo Portas e ele, infelizmente, não conseguiu corrigir.

Ora, não aceito que, nesta fase dos trabalhos da Comissão, se pretenda sistematicamente cristalizar essa ideia e é por isso que insisto em usar da palavra nesta terceira volta, porque discordo que se cristalize essa ideia e que, a pouco e pouco, se vá criando, como se fosse já uma conclusão dos trabalhos desta Comissão, que houve um dilúvio antes do Dr. Paulo Portas e há agora um paraíso depois do Dr. Paulo portas.

Desculpe, Sr. Dr. Luís Amado, porque isto não tem nada a ver consigo.

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O Sr. Presidente: – A resposta será sempre conjunta e, para já, não registo mais alguma inscrição.

Tem a palavra o Sr. Deputado Lobo d’Ávila.

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): – Sr. Presidente, aproveito esta terceira ronda apenas para dizer que, de facto, cada um dos partidos que está aqui nesta Comissão Parlamentar de Inquérito aceita aquilo que bem entender e faz a interpretação que bem entender, e não será o CDSS, seguramente, a limitar a interpretação que o Bloco de Esquerda pretende fazer sobre aquilo que já aqui foi dito e repetido.

Portanto, a única coisa que quisemos alinhar, em função de um conjunto de depoimentos que recorreram à utilização de adjetivos sobre a problemática das contrapartidas, foi exatamente uma linha de coerência para perceber o que é que correu mal. E isso é tão simples. Julgo que o Sr. Deputado João Semedo também o fará, de acordo com a interpretação que bem entender, que é a sua.

Em democracia, cada um tem a interpretação que bem entender. E é assim e continuará a ser, seguramente, até ao fim dos trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito.

O Sr. Presidente: – Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): – Sr. Presidente, é para interpelar a Mesa e, se me permite, para fazer uma sugestão.

O Sr. Presidente: – Sr. Deputado, então, pedia-lhe que deixasse o Sr.

Dr. Luís Amado fazer algum comentário, se o deseja…

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O Sr. Dr. Luís Amado: – Não desejo fazer mais comentários, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: – Uma vez que o Sr. Dr. Luís Amado não tem mais comentários a fazer, então, para uma interpelação, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães queira fazer.

O Sr. José Magalhães (PS): – Sr. Presidente, a minha sugestão é que dispensemos o Dr. Luís Amado, que, certamente, tem coisas para fazer, e continuemos entre nós esta discussão, com a qual o Dr. Luís Amado não tem absolutamente nada a ver. Ele bem gostaria de entrar nela, mas não agora!…

O Sr. Presidente: – O Sr. Deputado, desse ponto de vista, na minha opinião e se me permite que tenha opinião sobre isso, tem toda a razão, só que isso tem a ver com a técnica que o Sr. Deputado João Semedo entendeu usar, e também entendeu usar livremente, que foi a de, na ronda de perguntas, levantar uma questão que era mais dirigida a um outro Deputado, que, obviamente, se sentiu na necessidade de responder. Foi isso o que aconteceu, mas está resolvido e não obriga o Sr. Dr. Luís Amado.

Sei que o Sr. Dr. Luís Amado tem, de resto, desse ponto de vista, a mesma experiência que o Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila. Também tive ocasião de o questionar várias vezes, no âmbito de uma outra Comissão onde veio muitas vezes como Ministro dos Negócios Estrangeiros, e tivemos até, uma vez, uma divergência algo séria, ainda que tenha sido uma exceção absoluta à regra e à cordialidade que temos, que mantemos e que,

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de resto, é seu traço de personalidade, que todos nós muito respeitamos e apreciamos nesta Câmara.

Sr. Doutor, agradecemos mais uma vez a sua presença e toda a disponibilidade que teve para estar connosco e responder a todas as perguntas dos Srs. Deputados.

Srs. Deputados, antes de ouvirmos, como nos sugeriu várias vezes o Sr. Dr. Luís Amado, o Sr. Eng.º Rui Neves, esclarecendo e complementado os esclarecimentos, eu talvez pedisse, com a paciência provavelmente do próximo depoente, cinco minutos de intervalo porque estamos aqui já a algum tempo. Portanto, daqui a cinco minutos retomaríamos, com o depoimento do seguinte.

Muito obrigado, Sr. Doutor, mais uma vez. Esta encerrada a reunião.

Eram 17 horas e 36 minutos.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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